Epístola aos Romanos Por Martinho Lutero (Parte 2) Vale a pena ler!




  1. Pecado
    A Escritura Sagrada chama pecado, não somente a obra exterior do corpo, senão a todas as atividades que impelem, ou movem para ela, como seja, o íntimo do coração com todas as suas forças. Por conseguinte a palavrinha fazer significa que o homem se entrega completamente ao pecado. Pois não se produz nenhuma obra exterior do pecado a menos que o homem se empenhe nela com corpo e alma. A Escritura enfoca especialmente ao coração e àraiz e à fonte principal de todo pecado que é a incredualidade no íntimo do coração. Assim como somente a fé justifica, trazendo consigo o Espírito e o prazer para as boas obras exteriores, da mesma maneira também somente a incredulidade peca e incita a carne e a faz sentir prazer pelas más obras exteriores, como ocorreu com Adão e Eva no Paraíso, Gen. 3:26.
    Por isso Cristo chama pecado somente a incredulidade, quando diz em João 16:8, 9: "O Espírito castigará o mundo, por causa do pecado, porque não crêem em mim". Por isso também, antes de ocorrer boas ou más obras, como sucede nos bons e maus frutos, deve existir primeiro no coração a fé ou a incredulidade, como raiz, como seiva, e força principal de todos os pecados, que é chamado nas Escrituras a cabeça da serpente, e do velho dragão que seria espisoteada pela descendência da mulher, por Cristo, como foi prometido a Adão.


  2. Graça
    A diferença entre graça e dádiva é que graça significa propriamente benevolência ou favor de Deus que ele abriga consigo mesmo para conosco e que inclina a dar-nos a Cristo, ao Espírito com seus dons. Assim o evidencia no capítulo quinto (Rom. 5:15) quando diz: "A graça e o dom em Cristo, etc. . ." Ainda que os dons e o Espírito cresçam diariamente em nós— não chegando nunca a ser perfeitos, de maneira que ainda permanecem em nós maus desejos e pecado, que lutam contra o espírito, como afirma mais adiante em Romanos 7:5, 14 e 23 e Gálatas 5:17 e como se promete em Gênesis 3:15, a luta entre a estirpe da mulher e da serpente—a graça faz tanto que nos podemos considerar completamente justificados diante de Deus; ela não se divide nem se fracciona, como ocorre com os dons, senão que nos incorpora totalmente em sua benevolência, por causa de Cristo, nosso intercessor e mediador, e por haver começado os dons em nós.
    Desta forma entendes, pois, o capítulo sétimo em que São Paulo se chama ainda pecador, e contudo afirma, no oitavo, que não há nada de condenável naqueles que estão em Cristo por causa dos imperfeitos dons e do espírito. Somos ainda pecadores por causa da carne que ainda não morreu, mas porque cremos em Cristo e temos o princípio do Espírito. Deus é tão favorável e misericordioso para conosco, que não considera tais pecados nem quer julgá-los, senão que procederá conosco segundo nossa fé em Cristo até que o pecado seja suprimido.
    3.  Fé
    A não é a ilusão humana ou o sonho que alguns consideram como tal e quando vêem que não segue um melhoramento da vida nem boas obras, ainda que todavia possam ouvir e falar muito sobre ela, então caem no erro e afirmam que a fé não é suficiente, de maneira que teriam de fazer obras para ser bom e salvo.
    Isto sucede quando escutam o evangelho e vêm depois e formam por conta própria um pensamento no coração que lhes diz: eu creio; depois consideram isso uma fé correta; mas como é uma invenção humana e um pensamento que nunca se experimenta no íntimo do coração, então não chega a produzir nada e não se segue nenhuma melhora.
    Mas a fé é uma obra divina em nós, que nos transforma e nos faz nascer de novo, de Deus, S. João 1:13, mata o velho Adão e nos faz ser um homem distinto de coração, de ânimo, de sentido e de todas as forças, trazendo o Espírito Santo consigo. A fé é uma coisa viva, laboriosa, ativa, poderosa de maneira que é impossível que não produza o bem sem cessar. Tampouco indaga se tem que fazer boas obras, senão, antes de perguntar já as fez e está sempre fazendo. Mas quem não faz tais obras é um homem incrédulo, anda às tontas. Busca a fé e as obras boas e não sabe o que é Fé ou boas obras, e fala, e conversa muito sobre ambas.
    A fé é uma viva e inamovível segurança na graça de Deus, tão certa que um homem morreria mil vezes por ela. E tal segurança e conhecimento da graça divina faz o homem alegre, valente e contente ante Deus e todas as criaturas, pois é o que realiza o Espírito Santo na fé. Por isso se está disposto e contente sem nenhuma imposição para fazer o bem e servir a qualquer um, para sofrer tudo por amor e louvor a Deus, que lhe tem mostrado tal graça. Por conseguinte, é impossível separar a obra da fé, tão impossível como é separar o arder e o resplandecer do fogo. Por isso deves ter muito cuidado ante teus próprios falsos pensamentos, e ante inúteis charlatães que querem ser inteligentes para julgar sobre as boas obras e são os mais torpes.
    Roga a Deus para que produza a fé em ti, do contrário ficarás eternamente privado dela, ainda que inventes ou faças o que quiserdes ou possas.


  3. Justiça
    Agora bem, a justiça é tal fé e se chama justiça de Deus, ou que vale diante de Deus, pelo fato de que é um dom de Deus e faz com que o homem dê a cada um o que lhe deve. Pois pela fé chega a ser o homem livre de pecado e a cumprir com agrado os mandamentos de Deus; com isso dá a Deus a honra que lhe corresponde e lhe paga o que lhe deve. Mas o homem lhe serve voluntariamente com o que pode e paga também com isso a qualquer um. Tal justiça não pode ser realizada pela natureza, pela livre vontade e por nossas forças. Pois assim como ninguém pode dar fé a si mesmo, tampouco ninguém pode tirar a incredulidade. Como se quer, pois, remover um só pecado, ainda que fosse o menor deles? Por isso é falsidade, hipocrisia e pecado o que ocorre fora da fé ou na incredulidade (Rom. 14:23) por mais que seja em aparência.


  4. Carne e espírito
    A carne e o espírito não deves compreender aqui como se a primeira fosse somente o que concerne a impureza, e o segundo ao interior do coração. Paulo chama carne, igualmente que Cristo (São João 3:6), a todo o nascido de carne, todo o homem com corpo e alma, com a razão e todos os sentidos. Precisamente porque tudo no homem tende para a carne, de modo que também podes chamar carnal àquele que sem a graça inventa muito sobre elevadas questões espirituais, ensina e fala muito. Podes aprender muito bem das obras da carne, segundo Gálatas (5:19 em diante) onde o apóstolo chama obra da carne também à heresia e ao ódio. Em Romanos 8:3 diz que, mediante a carne, a lei se debilita, o que não se afirma com respeito à impureza, mas a todos os pecados e principalmente no que respeita à incredulidade que é o mais espiritual dos vícios.
    Por outra parte, também tens que chamar espiritual àquele que realiza as obras mais externas, como Cristo ao lavar os pés dos discípulos, e Pedro ao conduzir a barca e pescar. Por conseguinte a carne é um homem que vive e realiza interna e externamente o que está ao serviço da carne e da vida temporal. O espírito é o homem que vive e realiza interna e externamente o que está a serviço do espírito e da vida eterna. Sem esta compreensão dessas palavras nunca entenderás esta epístola de São Paulo nem nenhum livro da Sagrada Escritura. Por isso deves precaver-te de todos os mestres que utilizam estas palavras em outro sentido, seja quem for, Jerônimo, Agostinho, Ambrósio, Orígenes, semelhantes a eles ou ainda superiores. Agora vamos considerar a Epístola.

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