O Reino da Graça e o Reino da Glória



"Assim também Cristo, tendo-se oferecido uma vez para sempre para tirar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o aguardam para a salvação."
Hb. 9: 28.

 
A mensagem do Evangelho gira em torno de dois grandes eventos: O primeiro é a segunda vinda de Cristo. Assim como há dois adventos distintos, há dois reinos distintos, trazidos à luz pelo Evangelho: O reino da graça e o reino da glória.
Quando Cristo começou a pregar "... e o reino de Deus está próximo..." (Mar. 1: 15) não estava se referindo ao futuro e imortal reino da glória. Ele se referia ao reino da graça que havia de estabelecer por seu amargo sofrimento e morte uma vez que este reino existia por propósito desde a eternidade, e por virtude de uma promessa desde a queda do homem (Rom. 16: 25; Gên. 3: 15).
Disse o escritor da epístola aos Hebreus: "Acheguemo-nos, portanto, confiantemente junto ao trono da graça a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça..." Heb. 4: 16. O trono da graça representa o reino da graça, uma vez que a existência de um trono implica a existência de um reino. Nos é dito que quando Cristo subiu ao céu assentou-se no trono (Heb. 1:3; Heb. 8: 12). Ele não se assentou no trono da glória; assentou-se no trono da graça, em seu trono sacerdotal do ofício intercessório. O profeta disse: "...Ele."assentar-se-á no seu trono e dominará e será sacerdote no seu trono..." Zac. 6: 13.
O reino da glória existe ainda que por virtude da promessa e não será estabelecido antes do segundo advento de Cristo. O próprio Jesus disse: "Quando vier o filho do homem na sua majestade e todos os anjos com ele, então se assentará no trono de sua glória, e toadas as nações serão reunidas em sua presença..." Mat. 25: 31, 32.

 
Confundindo os Dois Reinos
Na época do primeiro advento, o povo judeu esperava um Messias que haveria do assentar-se no trono de Davi. Quando ouviram João Batista proclamar, "O reino dos céus está próximo", encheram-se de visões da glória de um reino literal. Nem mesmo João Batista e os discípulos de Jesus tinham uma idéia correta do propósito do primeiro advento de Cristo, nem idéia da natureza do reino que Ele estava para estabelecer. No início eles não podiam distinguir claramente entre o reino da graça e o reino da glória. A mesma confusão existe ainda na mente de muitos que professam a fé cristã. Quando pessoas dizem que a vinda de Cristo é sua vinda ao coração de seu povo estão confundindo tragicamente o reino da graça e o reino da glória. Quando os crentes começam a buscar aqui e agora um cumprimento espiritual, uma segunda benção de perfeição empírica, estão tentando trazer certos elementos do reino da glória ao reino da graça, trazer o "ainda não" dentro do "já". 1 João 3:2.

 

 
O Reino da Graça
Um reino se estabelece costumeiramente por guerra e conquista. O reino da graça não é uma exceção. Ficou já estabelecido pelo conflito e a conquista do reino da morte e do diabo por parte de Cristo. "E despojando os principados e as potestades, publicamente as expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz." Col. 2: 15. "Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele igualmente participou para que por sua morte destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo." Heb. 2: 14.
Quem são os que entram no reino da graça? Os pecadores; os pecadores de toda classe. Porquanto Graça significa favor ou misericórdia para com aqueles que são pecaminosos, Perdidos e indignos. Os santos anjos não necessitam, nem tão pouco recebem, graça e não é previlégio deles entrar neste reino. Este reino é para o aleijado, para o coxo, para o cego. Do seu trono de graça Cristo advoga ante a Justiça para que os pecadores possam ser admitidos neste reino. Neles mesmos não têm direito à entrada. Somente merecem a morte e extermínio. Porém Cristo intercede pelos transgressores. Isa. 53: 1. Ele fez propiciação por seus pecados e satisfez a justiça em seu favor. Entre Deus e o pecador só fica a misericórdia— a infinita misericórdia. Graça significa ser aceito apesar de ser inaceitável. E ser completamente compreendido e completamente perdoado. Os que procuram fazer dignos a si mesmos ou mais aptos para entrar no reino da graça estão cavando de fato profundas valas diante das portas do reino que nunca poderão atravessar.
Não obstante, não devemos imaginar que a graça colocará um homem no céu contra sua própria vontade. Lá só podem entrar os que crêem. E não é que a fé possa ser autogerada pelo pecador (porque a graça, e unicamente ela, inspira e cria fé), mas a fé é o pecador dizer "sim" ao convite de Deus para entrar pelas portas da justificação e aceitação.
Se unicamente os pecadores podem entrar no reino da graça, quem, então, são os súditos desse reino? A resposta é: Os pecadores. Se não fossem pecadores não seria o reino da graça. Os súditos deste reino comem, bebem, e respiram graça. E a graça é somente para pecadores. O apóstolo Paulo disse: "Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus." Rom. 3: 23. Aqui temos uma definição do pecado. Significa estar destituído da glória de Deus. (Tanto no hebraico como no grego, a palavra para pecado em geral, significa ficar aquém, errar o alvo). Não somente estamos todos destituídos da glória de Deus, mas também continuamos cada vez mais destituídos da glória de Deus. Portanto, todos os santos na terra são ainda pecadores e continuam sendo pecadores em si mesmos tanto tempo quanto são destituídos da glória de Deus. E na mesma medida de tempo estão necessitados da graça.
"Justificados, pois, mediante a fé, tenhamos paz com Deus, por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo; por intermédio de quem obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes; e gloriemo-nos na esperança da glória de Deus." Rom. 5: 1, 2.
Os que estão justificados (os que estão dentro do reino da graça) se alegram na esperança da glória de Deus. Eles esperam, gemem, suspiram sua completa restauração como filhos de Deus. Juntamente com Paulo exclamam: "Ora, se somos filhos, somos também herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo: se com eles sofrermos, para que também com ele sejamos glorificados. Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não são para comparar com a glória por vir a ser revelada em nós. Porque sabemos que toda a criação a um só tempo geme e suporta angústias até agora. E não somente ela, mas também nós que temos as primícias do Espírito, igualmente gememos em nosso íntimo, aguardando a adoção de filhos, a redenção de nosso corpo. Porque na esperança fomos salvos. Ora, a esperança que se vê não é esperança; pois o que alguém vê, como se espera? Mas, se esperamos o que não vemos, com paciência o aguardamos." Rom. 8: 17, 18; 22-25.

 
Agora bem, estes são os fatos que têm sido claramente expostos: o povo de Deus ficará glorificado coletivamente quando seus corpos forem transformados por ocasião do segundo advento de Cristo. Todavia, eles não alcançaram essa glória. Pacientemente, porém, aguardam-na em esperança. Enquanto isso, eles estão carentes dessa glória de Deus, e nesse sentido são pecadores ainda, e confessam continuamente —se assim não fizessem seriam mentirosos (1 João 1: 8). E enquanto esperam que essa glória seja revelada neles, necessitam da graça. A graça deverá reinar até a glória, tal como declara Paulo: "...assim também reinasse a graça pela justiça para a vida eterna, mediante Jesus Cristo Nosso Senhor." Rom.5:21.
A graça é livre (ainda que não barata). Contudo é duro para o orgulhoso coração humano aceitar humildemente a dádiva que contém o custoso preço do tesouro celestial. E se os pecadores se pudessem convencer de sua necessidade de graça, sempre ficaria neles uma tendência de quererem livrar-se dela tão logo que pudessem. Querem "pagar sua própria passagem". Ou, como Martinho Lutero adverte em seu comentário sobre o livro de Romanos, algumas vezes se acham bem apressados para chegar a ser puros e santos, impecáveis. O reformador assemelha a situação do resgatado pecador com a do homem que foi socorrido pelo bom Samaritano. Cristo, o Bom Samaritano, aplica vinho e azeite às feridas do pecador e o conduz até a estalagem para o tratamento final. Encomenda o homem ao cuidado do estalajadeiro com promessa de pagar tais serviços em seu retorno. O paciente começa a convalescer. Todavia, nenhuma coisa poderia fazer mais dano do que supor-se completamente bom. Como disse Lutero, a igreja é uma estalagem ou enfermaria para o enfermo convalescente. E o redil da graça onde os internados são objetos de cuidado e solicitude especial de Cristo. Enquanto se tenham a si mesmos por pecadores que imploram a misericórdia de Deus, o Senhor os considerará com justos. Quando os espíritos fanáticos na Alemanha tantaram elevar-se acima da justificação pela fé Lutero exclamou: "Livre-me o Senhor de uma igreja onde há somente santos. Quero estar em companheirismo com os humildes, débeis e enfermos que reconhecem e sentem seus pecados e que gemem e clamam continuamente diante de Deus do fundo de seus corações para obter consolação e apoio."
A verdade de que se obtém justificação continuamente pela graça (Rom. 3: 24. Note o tempo presente contínuo) é conforto e consolação para os santos. Não é isto uma almofada macia onde os hipócritas possam descansar suas cabeças, nem um convite ao presunçoso para brincar sobre a misericórdia de Deus. No caso de que algum espírito antinomiano (contra a lei) perverta a verdade encorajando-se a pecar sem que sinta remorso algum na consciência, queremos dizer isto: aquele que pensa que pode continuar violando a Lei de Deus para que a graça abunde (Rom. 6: 1; 1 Jo. 3: 9) é ladrão e roubador que tenta alcançar o aprisco da graça entrando por outra via que não é a porta (Jo. 10: 1). Os que vivem debaixo da graça sabem quanto custou a Deus e a Cristo consegui-la para eles. Tais se deleitam na Lei de Deus segundo o homem interior e seu único lamento é saber que sempre estão muito abaixo de suas exigências (Rom. 7: 22-25). Preferem morrer a pecar deliberadamente. Contudo, compreendem que os melhores atos de suas vidas são indignos diante de Deus.
A Lei de Deus não foi posta de lado pela morte de Jesus; são sua penalidade e condenação para com os súditos da graça que foram canceladas. A Lei ainda cumpre sua missão de magnificar o pecado diante do crente para dar-lhe consciência permanente de que a graça deve continuar abundando. (Rom. 5: 20).

 
Continua...

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