O ex-frade Marcelo da Luz, 42, escreveu um livro que é uma azeitonada
metralhadora giratória – há ali balas para todos. No “Onde a religião
termina?" (486 págs, R$ 68, Editares), ele argumenta e procura provar,
entre outras coisas, o seguinte: Jesus Cristo é um mito, os evangélicos
são idólatras da Bíblia, a Igreja Católica é uma seita lavadora de
cérebros, o espiritismo não liberta e apenas consola, as religiões
atrasam a evolução da humanidade e os ateus são crentes equivocados.
Ninguém poderá acusar Luz de falar sobre o que não entende. Ele se
dedicou ao sacerdócio por 20 anos. Graduou-se no Brasil, Itália Estados
Unidos em ciências humanas, filosofia e teologia. Teologia, aliás, a
qual ele considera ser uma pseudociência, porque não faz pesquisa
alguma, mas apenas comparações de interpretações de dogmas em diferentes
momentos da história.
O questionador Luz é adepto de uma corrente de pensamento bem questionável: a conscienciologia.
Trata-se de uma proposta formulada pelo médico brasileiro Waldo Vieira
para abordar a consciência humana a partir do pressuposto de que o
universo e o homem são multidimensionais, o que explicaria os fenômenos
paranormais (ou parapsíquicos) e o da reencarnação -- não da alma, mas
da consciência.
Em entrevista a AD Luna, do Jornal do Commercio, o ex-frade explicou que
a conscienciologia não está contaminada por deslumbramentos,
misticismos, religiosidades, cultos etc. Para essa neociência, disse,
não existe um deus ao qual o homem é subserviente.
“Onde a religião termina?” se refere muito a Jesus pelo motivo óbvio de
que foi escrito por um ex-sacerdote cristão. É a parte mais polêmica do
livro.
Luz escreveu um capítulo para desconstruir a divindade atribuída a
Jesus. Ele sustenta que o Jesus histórico, o cidadão palestino do século
1, não tem nada a ver com o homem divino que foi inventado pelos
religiosos várias décadas após a morte de Jesus de Nazaré.
“Pedro e Paulo viam Jesus como um homem especial, mas não o consideravam
divino”, disse. “A figura divina do Cristo é um produto pouco a pouco
construído pelo fanatismo e interesse político de seus seguidores”,
afirmou.
“Não há motivos racionais para que alguém considere Jesus divino ou o
homem mais inteligente e brilhante que já existiu. Muito pelo contrário.
Hoje, qualquer pessoa esclarecida pode ir muito além de Jesus Cristo.”
Porque, pelo que se pode extrair dos evangelhos, só para citar alguns
exemplos, Jesus “foi sectário, obscuro em muitos momentos; usou discurso
demagógico e populista; fomentou o fanatismo ao reclamar para si o amor
exclusivo dos discípulos; foi ignorante quanto ao próprio
parapsiquismo; utilizou muitas vezes a coerção psicológica para
convencer os devotos (medo do inferno, proximidade do juízo final),
insuflou a violência em alguns momentos; pregou o amor condicional
(aqueles que não aceitam sua vontade serão condenados)... “
Seguem mais algumas afirmações do ex-frade:
-- A Conscienciologia busca investigar objetivamente a realidade da
consciência, sem crendice ou mistificação, reconhecendo no parapsiquismo
a chave para a pesquisa da realidade multidimensional do ser humano,
algo ainda amplamente ignorado pela ciência comum.
-- A religião fomenta a formação da mente sectária. O devoto vai
interpretar o restante do mundo por meio do foco dogmático da doutrina
professada pela sua religião. Estará convencido de que o seu grupo é
dono da “verdade” ou “revelação” absoluta. Inexiste religião
universalista.
-- Os líderes religiosos julgam ter as fórmulas seguras que levam à
realização absoluta. Uma metáfora evangélica expressa essa relação de
dependência: “pastores e ovelhas”. Animais passivos e indolentes, as
ovelhas obedecem ao comando do pastor. “Rebanho” é outra metáfora que
expressa a noção de “massa impensante”.
-- Devotos escolhem renunciar ao pensamento próprio para “terceirizarem” suas escolhas existenciais.
-- O passado e o presente da humanidade são manchados de sangue
derramado pelos religiosos. Essa violência é algo intrínseco aos credos
religiosos. A religião carrega em si a semente da violência, pois a
pregação da verdade absoluta exige sempre defesa e controle.
-- As religiões, historicamente, sempre fizeram apologia da tirania e da
escravidão. A defesa dos direitos humanos é uma ideia secular, não
religiosa.
-- Os movimentos cristãos mais contemporâneos, especialmente o
neopentecostalismo, “democratizaram” o milagre, tornando-o “mercadoria”
acessível. O que move as multidões a migrarem de igreja em igreja é a
expectativa do extraordinário, a obtenção do “favor” divino. Hoje, essa
sede de milagres é explorada comercialmente, dando razão à máxima
“Templo é dinheiro”.
-- Durante algum tempo, ainda enquanto padre, também defendi o
sincretismo com o Oriente. Contudo, cobrir algo que já é irracional (a
mensagem cristã) com outra coisa também obscura (os misticismos
orientais são, em grande parte, resultado da ignorância quanto ao uso
ético do parapsiquismo) não resolverá o problema.
-- O autoconhecimento pode dispensar qualquer tipo de adulação ou culto a
seres supostamente superiores, pois um ser verdadeiramente superior ou
evoluído jamais estará interessado na submissão das pessoas.
- Reconheço os méritos desses (Richard Dawkins e Sam Harris) e de outros
escritores secularistas. Eles são admiráveis porque trouxeram a
religião para a mesa de debate, denunciando os absurdos do pensamento
religioso. Mas é inegável que acabam recaindo em um novo dogma: a
afirmação da inexistência de “Deus”.
-- Os deuses das religiões (e o deus cristão não é exceção) não existem,
são apenas ideias, projeções aumentadas das ambições e desejos humanos.
Penso que os escritos de Dawkins e Harris nos ajudam a compreender
isso. Contudo, eles acabam dando um salto muito grande ao pretenderem
negar a possibilidade de uma causa primeira para o universo, pois
simplesmente não sabemos coisa alguma sobre quem ou o que é isso. Esse
assunto permanece inalcançável às nossas possibilidades cognitivas.
-- A própria noção de eternidade, paraíso, céu, absoluto, denota a ideia
de algo estático, a cessação do processo de evolução, o que não faz
sentido.
-- Como imaginar que um único indivíduo humano, Jesus Cristo (cheio de
imaturidades) possa ser a medida de todas as consciências do cosmo?
-- O grande problema do espiritismo, embora este tenha experiência da
“reencarnação”, é que, além de cultivar o misticismo, mantém a figura de
Jesus e a ideia do Deus cristão como modelos evolutivos.
-- A diretriz norteadora das discussões conscienciológicas é o princípio
da descrença: não acredite em nada. Nem mesmo naquilo que você lê aqui.
Experimente. Tenha suas próprias experiências.
Notícias Cristãs com informações do Jornal do Commercio via Paulo Lopes
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