Pregação Biblica
Por Dr. Joel Beeke
Raízes da evangelização moderna
A fim de compreendermos estes dois pensamentos
(o método da evangelização Puritana e a disposição interna do coração) precisamos
contrastá-los com a evangelização moderna. Só assim poderemos apreciar o aspecto
característico da evangelização puritana. Para isso vamos voltar um pouco ao século
XIX para considerarmos as raízes da evangelização moderna.
A evangelização moderna tem as suas raízes
nos anos 1820 sob a liderança de Charles Finney, que frequentemente é chamado de
"o pai" da evangelização moderna. Finney foi criado em Nova Iorque e tinha
o grau de advogado. Começou sua prática como advogado nos anos de 1820 em Nova Iorque.
No ano seguinte teve uma experiência religiosa muito profunda e isso o influenciou
para que deixasse seu escritório de advocacia e se dedicasse inteiramente ao ministério.
Foi ordenado pastor presbiteriano em 1824 e por 8 anos liderou eventos e reuniões
de avivamento no leste dos E.U.A. Por quatro anos trabalhou como pastor em Nova
Iorque e nos últimos quarenta anos de sua vida foi professor na Universidade de
Oberlin no estado de Ohio. Através dessas décadas ele continuou fazendo reuniões
de avivamento. Ele inventou aquilo que se chama de "novas medidas" para
avivamento que incluem: (a) reuniões com muita emoção e (b) o banco dos "ansiosos".
Eram reuniões evangelísticas caracterizadas por uma atividade intensa, que duravam
dois ou três dias e nos quais Finney pregava duas vezes ao dia. O banco dos "ansiosos"
era o primeiro banco da igreja que era deixado vazio para que as pessoas ansiosas
pudessem vir e se assentar ali, recebendo uma ministração individual. No final dos
seus sermões Finney diria: "Aqui está o banco dos "ansiosos", se
vocês estiverem do lado do Senhor, venham à frente." Hoje a evangelização de
massa, é um desenvolvimento das chamadas "novas medidas" dos avivamentos
de Finney.
Em suas campanhas evangelísticas, Billy
Graham apresenta um estilo polido destas cruzadas feitas por Finney. Essas chamadas
ao altar para que as pessoas venham à frente e confessem Jesus Cristo, é uma versão
moderna do banco dos "ansiosos". Hoje nós estamos tão acostumados com
este estilo de evangelização moderna, que dificilmente percebemos que é uma inovação
na história da Igreja. Com frequência nos esquecemos de quão distante está da evangelização
bíblica. Tanto Finney, quanto a evangelização moderna, cometeram alguns erros básicos
em diferentes aspectos das Escrituras. Vamos mencionar quatro áreas em que se afastaram
dos princípios bíblicos.
Deficiências da evangelização moderna
1.
Aceitação do pelagianismo. Embora certos
elementos calvinistas estejam presentes, a evangelização moderna, seguindo a teologia
de Finney, é essencialmente arminiana na sua apresentação do evangelho. Finney era
confessadamente um pelagiano (Pelágio foi um herege do século IV que sofreu dura
oposição de Agostinho). Ele negava que o homem caído fosse incapaz de se arrepender.
Dizia que cada pessoa tem a liberdade e a vontade livre de arrepender-se e voltar-se
para Deus; que cada pecador pode resistir ao chamado do Espírito Santo, e que este
Espírito apenas apresenta-lhe razões pelas quais ele deve ir a Deus. O pecador,
entretanto, é livre para aceitar ou rejeitar as razões apresentadas. Dessa forma,
em última análise, a salvação não é uma obra de Deus, é realmente um trabalho do
próprio homem. Finney escreveu o seguinte: "Pecadores vão para o inferno apesar
de Deus”. Finney negou os cinco pontos do calvinismo, e não subscreveu os ensinamentos
de Jesus de que o homem precisa nascer de novo, nascer do alto, doutra forma ele
não pode entrar no reino de Deus.
2. Finney e a
evangelização moderna colocam uma pressão indevida sobre a vontade humana. Se a vontade humana, pecadora, ué livre,
segundo os evangelistas semipelagianos afirmam, a pregação ué reduzida simplesmente
a uma batalha entre a vontade dos ouvintes e a vontade do pregador. O resultado
disso é que todos os meios que o pregador puder usar para persuadir os seus ouvintes
a aceitar a Cristo, acabam se tomando lícitos, mesmo que sejam baseados num excesso
de emocionalismo do auditório. O alvo principal nestes casos é mover a vontade do
homem, e levá-lo a fazer uma decisão imediata. O contrário disso, vemos no ensino
de João 1: 13: “... os quais não nasceram do sangue nem da vontade da carne,
nem da vontade do homem, mas de Deus”.
3. Finney e a
evangelização moderna reduzem o processo de conversão a um espaço curto de tempo. Isso não é bíblico! A Bíblia apresenta a
conversão como sendo um processo por vezes demorado. Entretanto, para a evangelização
moderna, a conversão é um processo de mais ou menos dez minutos. Recentemente foi
escrito um livro sobre evangelização que faz com que o evangelista caia em profundo
sentimento de culpa, se demorar mais de dez minutos para converter alguém. Chegamos
a conclusão que, para muitos evangelistas modernos, a salvação não é mais aquele
trabalho miraculoso, soberano e misterioso do Espírito Santo de Deus, e sim, o trabalho
calculável da ação do homem. Isso é contrário ao que lemos em João 3:8: “O vento
sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim
é todo o que é nascido do Espírito". O que realmente tem acontecido nos
últimos 175 anos, é o seguinte: Finney e a evangelização moderna perderam o sentido
de conversão bíblica; perderam o conceito de conversão como uma obra miraculosa;
perderam o sentimento daquela dependência total do homem em Deus, na sua conversão.
4. Grande parte
dos resultados da evangelização moderna é questionável. Diversos estudos têm provado que a evangelização
de massa, utilizado em grande parte nas cruzadas, em que o próprio homem decide
a sua salvação, leva, finalmente, a um cristianismo muito superficial, que quase
não dá fruto. Isso não quer dizer que não existam certos indivíduos a quem Deus
realmente converteu em utais tipos de reuniões. A Bíblia diz que Deus pode fazer
com que uma vara torta se tome reta. Entretanto, esse fato não nos isenta da responsabilidade
em apresentar aos nossos ouvintes uma evangelização bíblico e saudável, uma evangelização
que tenha uma profundidade maior, uma evangelização que começa, centraliza-se e
termina em Deus. É isso que descobrimos quando nos voltamos upara o método dos puritanos.
Estilo direto de pregar
Quando nos referimos aos métodos da evangelização
puritana, não estamos dizendo que devemos copiar cada detalhe dos puritanos. Muito
da linguagem dos puritanos, por exemplo, está fora de época. Ainda assim os seus
métodos têm muito para nos ensinar. O método puritano foi chamado pelos próprios
puritanos, e por estudiosos hoje, de o "estilo direto de pregação". Um
dos pais do puritanismo, William Perkins, escreveu o seguinte: "A nossa
pregação precisa ser direta e evidente. É um dito comum entre nós: "este foi
um sermão direto. "Eu digo que quanto mais incisivo e simples for o
sermão, melhor". Um dos grande pregadores puritanos chamado Henry Smith
disse o seguinte: "Pregar de uma maneira direta, não ué pregar de uma maneira
dura e cruel". Também não significa pregar de qualquer forma, sem estudo.
Significa pregar o sentido pleno das Escrituras de uma maneira tão clara que o homem
mais simples possa entender o que esteja sendo ensinado, como se ele estivesse ouvindo
seu próprio nome ser chamado.
Implementando este estilo simples e incisivo de pregação, os puritanos seguem
um processo de três passos:
(1) Escolhem e estudam seu texto. (2) Fazem uma exegese desse texto, dando
o seu sentido básico, e em seguida coletam do texto duas ou três doutrinas, que
fluem dele. (3) Em seguida, aplicam estas doutrinas de uma forma prática ao coração
dos seus ouvintes. Dessa forma, a primeira parte do sermão é exegética, a
segunda parte é doutrinária e a terceira é aplicativa. À quarta parte
eles chamavam de "como usar", que é a parte prática do sermão, como usar
os ensinos na vida diária. Eles dividem a aplicação em duas partes, uma para os
ouvintes que são salvos, e a outra para os não salvos. Aplicam a cada indivíduo
o que o texto pregado tem a dizer para ele. Dessa forma, o ouvinte, ao sair da igreja,
sabia com toda clareza o que aquele texto do sermão tinha a dizer a si em particular.
Vamos focalizar quatro qualidades deste estilo direto de pregar.
1. Usavam um método racional de pregar. Eles pregavam a criaturas racionais. Trabalhavam
arduamente para mostrar aos pecadores a loucura de não buscar o Senhor. Eles procuravam
mostrar às suas congregações o aspecto racional de todas as doutrinas da graça.
John Owen, por exemplo, expunha à sua congregação como a doutrina da eleição era
racional e lógica. Eleição é a primeira coisa do lado de Deus, mas é a última coisa
que ué conhecida do lado daquele que crê. Eles usavam este tipo de ensino upara
alcançar a mente e também a consciência. Labutavam para conduzir cada ouvinte a
esta conclusão. Seria totalmente ridículo não buscar o Senhor. Ridículo em função
do julgamento que há de vir, mas também em termos da maneira como vivemos nesta
vida presente.
2. Tinham uma pregação afetuosa, apaixonada. É uma coisa rara nos nossos dias encontrar
um pregador que tanto alimenta a mente dos ouvintes com substância bíblica sólida,
quanto também mova os seus corações, com um calor afetivo. Mas, esta combinação
era coisa comum aos pregadores puritanos. Falavam com amor e com convicção. Pregavam
com uma chamada clara à fé e ao arrependimento. Pregavam com paixão o terror do
pecado. Pregavam com calor a respeito de Jesus Cristo. Derramavam do púlpito suas
próprias almas em seus sermões. Eles praticamente davam suas vidas pelo seu povo.
Suplicavam aos seus ouvintes que se reconciliassem com Deus, não porque pensassem
que eles podiam use reconciliar com um Deus santo, mas porque eles sabiam que o
Deus todo-poderoso usa a loucura da pregação para salvar aqueles que realmente vão
crer. Sabiam, pelas Escrituras, que somente o Cristo onipotente podia vivificar
um pecador espiritualmente morto e mortificar a sua pecaminosidade, separá-lo dele
mesmo, fazendo-o desejoso de abandonar o seu pecado e voltar-se para Deus e para
a salvação completa por Ele oferecida. A pregação puritana apresentava todas estas
verdades com paixão.
3. A evangelização
puritana era reverente e sóbria. Os puritanos geralmente não usavam humor nos seus sermões; não acreditavam
em contar histórias engraçadas com a finalidade de levar pessoas a se interessarem
por Cristo. O alvo deles era exatamente o oposto. Eles procuravam fazer as pessoas
se tomarem mais sóbrias diante das grandes exigências do Criador e diante do grande
juízo que está chegando. Diante da eternidade, Deus é digno de ser adorado; digno
por causa dEle mesmo e por causa de Seu Filho.
4. A evangelização
puritana se caracterizava por fazer uma análise específica de temas bíblicos. Se um puritano pregasse sobre o inferno,
o sermão inteiro seria sobre o inferno. O mesmo aconteceria se pregasse sobre o
céu, todo o sermão seria sobre o céu. Noutras palavras, eles pregavam o seu texto
o tempo todo. Calculavam que assim, após certo período de tempo, teriam coberto
cada assunto principal da Bíblia. Assim, procuravam edificar o seu povo em todo
o conselho de Deus, demonstrando sua apreciação por todo o ensinamento das Escrituras.
Quero dar alguns exemplos. Os títulos que vou dar agora são de um livro de um puritano:
"Quantos Já Experimentaram Uma Vida Seriamente Identificada com Deus?";
"Qual o Melhor Preservativo Contra a Depressão Espiritual"; "Como
Podemos Crescer no Conhecimento de Cristo?"; "O Que Precisamos Fazer Para
Evitar o Orgulho Espiritual?"; "Como Devemos Lidar Com Doutrinas Que Não
Podemos Compreender Completamente?"; "Como Podemos Conhecer de Uma Forma
Melhor o Valor Real da Nossa Alma?". Espero que vocês estejam percebendo quão
específicos eram os puritanos ao pregarem o seu texto bíblico, e como depois de
certo período de tempo eles conseguiam falar a respeito de todo o conjunto de verdades
espirituais.
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