Salmo 69 e a Livre Oferta do Evangelho
Rev. Angus Stewart
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto
(Parte 1)
Na primeira sentença do seu artigo, “The Free Offer of the Gospel”, John Murray
identifica sucintamente a questão chave no debate: “Parece que o ponto real na disputa
em conexão com a livre oferta do evangelho é se pode ou não ser apropriamente dito que
Deus deseja a salvação de todos os homens” (Collected Writings, vol. 4, p. 113; itálico de
Murray).
“Todos os homens” inclui os eleitos e os réprobos, aqueles a quem, “para louvor
da sua gloriosa justiça, foi Deus servido não contemplar e ordená-los para a desonra e ira
por causa dos seus pecados (Confissão de Fé Westminster 3.7).
“Salvação” certamente inclui as bênçãos da união com Cristo, a regeneração,
chamado, justificação, adoção, santificado, preservação e glorificação (bênçãos dadas
somente aos eleitos; Romanos 8:29-30).
John Murray argumenta corretamente que se Deus deseja dar ao réprobo o fim (as
bênçãos da salvação), ele deve desejar dar-lhes também os meios para esse fim, a saber,
arrependimento e fé: “É a mesma coisa dizer ‘Deus deseja a salvação deles’ ou ‘Ele deseja
o arrependimento deles’” (p. 114).
Assim, a pergunta é: o Deus verdadeiro deseja salvar o réprobo? Isto é, Deus
deseja unir os réprobos a Cristo e regenerar, chamar, justificar, adotar, santificar,
preservar e glorificá-los? Ele deseja dar aos réprobos arrependimento e fé? O que dizem
as Escrituras?
Mateus 27:34, 48 (e as passagens paralelas nos relatos dos outros evangelhos) prova
que é Jesus Cristo quem está falando no Salmo 69:21: “Na minha sede me deram a beber
vinagre”. Cristo então começa a orar contra os réprobos ou não-eleitos (v. 28). Ele ora:
“Escureçam-se-lhes os seus olhos, para que não vejam” (v. 23; iluminação ou
conhecimento é parte da fé [Ef. 3:17-19]). “Acrescenta iniqüidade à iniqüidade deles, e
não entrem na tua justiça” (v. 27; justiça é um dom na justificação e santificação). Ele ora
a Deus pela ruína eterna deles: “Derrama sobre eles a tua indignação, e prenda-os o ardor
da tua ira” (v. 24). Tão longe está Jesus de desejar a salvação dos réprobos, que ele ora
para que eles não sejam justificados ou santificados (v. 27), para que sejam condenados
por seus pecados e não glorificados (v. 24), e para que não recebam a fé (v. 23).
2
Lembre-se: essas orações (que se opõem ao erro da livre oferta) são colocadas nos
lábios do Salvador sobre a cruz, quando lhe “deram a beber vinagre” (v. 21).
(Parte 2)
Alguns que sustentam a livre oferta concordam que o Salmo 69 apresenta a
vontade de Cristo que os inimigos do Messias sejam destruídos. Assim, eles crêem que
Deus deseja condenar os réprobos, e deseja salvá-los (mas não o faz). Todavia, Jó diz de
Deus: “O que a sua alma quiser, isso fará” (23:13). Se “o homem de coração dobre é
inconstante em todos os seus caminhos” (Tiago 1:8), o que dizer sobre um deus de
coração dobre, que deseja duas coisas contraditórias? Defensores da livre oferta
respondem que as (supostas) “duas ‘vontades’ em Deus” estão em dois “níveis”. Mas
Deus tem somente uma vontade, e não existem “níveis” nele, pois ele é um e em nenhum
aspecto dois (Dt. 6:4).
Aqueles que crêem que Deus deseja salvar os réprobos argumentam em favor de
sua posição a partir da oração de Cristo em Lucas 23:34: “Pai, perdoa-lhes, porque não
sabem o que fazem”. Mas isso inclui os réprobos? Alguns dos opressores de Cristo
tinham pecado contra o Espírito Santo (Mt. 12:31-32).2 Cristo não poderia ter orado por
eles, de acordo com 1 João 5:16.3 Anteriormente Cristo tinha orado: “Pai… bem sei que
sempre me ouves” (João 11:41-42). Deus, que sempre ouve a Cristo, falha em responder à sua
oração em Lucas 23:34, mesmo em parte? Além do mais, Cristo disse umas poucas horas
antes da cruz: “Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste,
porque são teus” (João 17:9). A intercessão de Cristo, como a expiação sobre a qual é
baseada, é sempre particular e eficaz (Rm. 8:34). Sua oração em Lucas 23:34 foi
respondida na salvação do ladrão arrependido e de milhares em Jerusalém (Atos 2:34;
4:4).
O Cristo de Deus ama, deseja salvar e morreu por sua igreja (Ef. 5:25), e quer a
destruição dos réprobos (Sl. 69:22-28). Esse Cristo deve ser pregado e todos devem ser
exortados urgentemente a se arrepender e crer nele.
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