O CRISTÃO E A POLÍTICA
“Portanto, quer comais quer bebais, ou façais outra qualquer coisa, fazei tudo para a glória de Deus” ( I Epístola de Paulo aos Coríntios 10.31).
Discorrer sobre as relações a serem estabelecidas entre o cristão e a política é, sempre, uma tarefa difícil e distanciada de compreensões minimamente consensuais. Aqui, nesse território, freqüentemente, predominam os pontos de vista controvertidos e, não raro, diametralmente opostos. Para muitos, a política é o explícito universo do mal moral e ontológico, dela devendo afastar-se completamente todos os que anseiam por uma vida espiritual mais autêntica e matizada por infrangíveis laços de comunhão com o Senhor. Para outros, o cristão deve participar, sim, ativamente, da vida política, buscando ocupar todos os espaços propiciados por ela.
Com quem está afinal das contas, a razão? Com os arautos do absenteísmo ou com os pregoeiros do engajamento? A resposta, creio, sempre estribada na regra única de fé e de prática dos cristãos, As Escrituras Sagradas, não se confina nos limites de uma adesão apaixonada ou de uma alienada deserção da seara política, mas pede uma abordagem que leve em conta, fundamentalmente, o que Deus diz em Sua Palavra; que valorize os princípios que Ele estabeleceu a fim de, em todas as coisas, nos comportarmos de maneira digna do evangelho, promovendo, desse modo, a Teleologia mais excelente do universo: a glória de Deus.
Em primeiro lugar, temos de entender, se quisermos ser catalogados no rol dos que se esforçam para pensar biblicamente sobre a realidade, que a política, em suas múltiplas instâncias, é uma instituição ordenada por Deus; vincula-se à Teologia da Criação; e está adstrita à esfera administrativa da graça comum do senhor; aquela que, diferentemente da graça salvadora, a todos os seres humanos é destinada; sempre com propósitos bem específicos.
Depois de criar o mundo, nele deleitando-se, vendo que tudo quanto havia feito exibia a marca indelével da bondade, Deus deu ao homem as sagradas prerrogativas de crescer, multiplicar-se, dominar a terra e administrá-la com amor e sábia autoridade. Tal administração, é claro, inclui, em tom maior, a ação política, que deveria, e deve ser sempre voltada para a prática do bem estar coletivo. No Novo Testamento, O Espírito Santo conduz Paulo, o santo apóstolo, a afirmar que “não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por ele instituídas” (Romanos 13.1b).
Ratifica-se, aqui, a verdade bíblica de que a atividade política não é uma invenção do demônio, mas sim uma ordenança divina para o disciplinamento e harmonização da convivência social entre os homens. Em segundo lugar, é perfeitamente legítima a participação dos cristãos na vida política do país, desde que neles haja a força da vocação, a consciência da convicção e, sobretudo, o peso ético-moral das motivações certas: glorificar a Deus e produzir um ser/fazer político que honre ao Senhor e, de igual modo, promova o bem da coletividade. Coletividade essa que, pensada em termos de Brasil, é sempre marcada pela iníqua presença de todo o tipo de flagelo: fome, falta de educação, de saúde, de lazer, de moradia decente, de informação, de cidadania e dignidade, enfim.
Assim, o propósito de quem assume ser um vocacionado por Deus para o exercício da vida pública não é, como advogam muitos, ser um partidário das causas que dizem respeito apenas à comunidade evangélica, como se fôssemos uma classe separada no contexto mais amplo da sociedade brasileira, mas sim ser alguém que ama a Deus e, de igual modo, os valores fundamentais do seu reino: a solidariedade, o amor ao próximo, a compaixão, a ética, a integridade e a justiça. O problema, gravíssimo problema, é que muitos evangélicos, ao se elegerem para os mais variados cargos públicos, exibem um comportamento tão censurável quanto o daqueles que não conhecem ao Senhor e não valorizam a sua Palavra; antes, são movidos unicamente pelo jogo, por vezes sórdido, de inconfessáveis interesses.
Em terceiro lugar, todos os cristãos, quer inseridos na vida ativa da política partidária, quer não, são exortados por Deus a orar pelas autoridades, a fim de que o Senhor, por graça e misericórdia, conceda a cada uma delas o tirocínio necessário para a implementação de políticas públicas que tragam benefícios ao maior número possível de pessoas da sociedade. Estamos diante de uma clara ordenança bíblica: “Antes de tudo, pois, exorto que use a prática de súplicas, orações, intercessões, ações de graças, em favor de todos os homens, em favor dos reis e de todos os que se acham investidos de autoridade, para que vivamos vida tranquila e mansa, com toda piedade e respeito. Isto é bom e agradável diante de Deus, nosso Salvador” (1 Timóteo 2.1-3). Nesse ponto, desconfio que muitos de nós seremos achados em falta, pois talvez não estejamos levando a sério o explícito mandamento que o Senhor nos dá em sua normativa e suficiente Palavra.
Em quarto lugar, fiquem certos os que se engajam no exercício da política partidária, cristãos e não cristãos, que Deus, que pesa os espíritos e sonda os corações, haverá de promover acerto de contas com todos aqueles que fizeram do poder de que foram investidos, não um instrumento de realização do bem comum, mas o trampolim mais certeiro e rápido para a obtenção de vantagens puramente pessoais. Que trocaram a voz profética de João Batista, que muitas vezes leva à morte e ao desprezo dos poderosos, pelos fartos banquetes da mesa do rei. Em último lugar, que em tempo de eleições, ao sermos chamados para o lídimo exercício do voto, intocável coração do regime democrático, não nos esqueçamos de que somos a igreja do Senhor Jesus Cristo, luz do mundo e sal da terra. E de que a nossa política maior, indisputável e intransferível, é pregarmos o evangelho da salvadora graça que há em Cristo Jesus; e o vivermos de tal modo que, olhando para o nosso testemunho, possa o mundo dizer: eis ali um verdadeiro discípulo do Senhor.
JOSÉ MÁRIO DA SILVA
PRESBÍTERO
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