Nos tornando Semelhantes a Cristo

 O Paradigma: Tornando-nos mais Semelhantes a Cristo John Stott 


    • Lembro-me muito claramente de que há vários anos, sendo um cristão ainda jovem, a questão que me causava perplexidade (e a alguns amigos meus também) era esta: Qual é o propósito de Deus para o seu povo? Uma vez que tenhamos nos convertido, uma vez que tenhamos sido salvos e recebido vida nova em Jesus Cristo, o que vem depois? É claro que conhecíamos a famosa declaração do Breve Catecismo de Westminster: “O fim principal do homem é glorificar a Deus, e gozá-lo para sempre”. Sabíamos disso e críamos nisso. Também refletíamos sobre algumas declarações mais breves, como uma de apenas sete palavras: “Ama a Deus e ao teu próximo”. Mas de algum modo, nenhuma delas, nem outra que pudéssemos citar, parecia plenamente satisfatória. Portanto, quero compartilhar com vocês o entendimento que pacificou minha mente à medida que me aproximo do final de minha peregrinação neste mundo. Esse entendimento é: Deus quer que seu povo se torne semelhante a Cristo. A vontade de Deus para o seu povo é que sejamos conformes à imagem de Cristo. Sendo isso verdade, quero propor o seguinte: em primeiro lugar, demonstrarmos a base bíblica do chamado para sermos conformes à imagem de Cristo; em segundo, extrairmos do Novo Testamento alguns exemplos; em terceiro, tirarmos algumas conclusões práticas a respeito. Tudo isso relacionado a nos assemelharmos a Cristo. Então, vejamos primeiro a base bíblica do chamado para sermos semelhantes a Cristo. Essa base não se limita a uma passagem só. Seu conteúdo é substancial demais para ser encapsulado em um único texto. De fato, essa base consiste de três textos, os quais, aliás, faríamos muito bem em incorporar conjuntamente à nossa vida e visão cristã: Romanos 8:29, 2 Coríntios 3:18 e 1 João 3:2. Vamos fazer uma breve análise deles. Romanos 8:29 diz que Deus predestinou seu povo para ser conforme à imagem do Filho, ou seja, tornar-se semelhante a Jesus. Todos sabemos que Adão, ao cair, perdeu muito — mas não tudo — da imagem divina conforme a qual fora criado. Deus, todavia, restaurou-a em Cristo. Conformar-se à imagem de Deus significa tornar-se semelhante a Jesus: O propósito eterno de predestinação divina para nós é tornar-nos conformes à imagem de Cristo. O segundo texto é 2 Coríntios 3:18: “E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, Monergismo.com – “Ao Senhor pertence a salvação” (Jonas 2:9) www.monergismo.com 2 o Espírito”. Portanto é pelo próprio Espírito que habita em nós que somos transformados de glória em glória — que visão magnífica! Nesta segunda etapa do processo de conformação à imagem de Cristo, percebemos que a perspectiva muda do passado para o presente, da predestinação eterna de Deus para a transformação que ele opera em nós agora pelo Espírito Santo. O propósito eterno da predestinação divina de nos tornar como Cristo avança, tornando-se a obra histórica de Deus em nós para nos transformar, por intermédio do Espírito Santo, segundo a imagem de Jesus. Isso nos leva ao terceiro texto: 1 João 3:2: “Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é”. Não sabemos em detalhes como seremos no último dia, mas o que de fato sabemos é que seremos semelhantes a Cristo. Não precisamos saber de mais nada além disso. Contentamo-nos em conhecer a verdade maravilhosa de que estaremos com Cristo e seremos semelhantes a ele, eternamente. Aqui há três perspectivas: passado, presente e futuro. Todas apontam na mesma direção: há o propósito eterno de Deus, pelo qual fomos predestinados; há o propósito histórico de Deus, pelo qual estamos sendo transformados pelo Espírito Santo; e há o propósito final ou escatológico de Deus, pelo qual seremos semelhantes a ele, pois o veremos como ele é. Estes três propósitos — o eterno, o histórico e o escatológico — se unem e apontam para um mesmo objetivo: a conformação do homem à imagem de Cristo. Este, afirmo, é o propósito de Deus para o seu povo. E a base bíblica para nos tornarmos semelhantes a Cristo é o fato de que este é o propósito de Deus para o seu povo. Prosseguindo, quero ilustrar essa verdade com alguns exemplos do Novo Testamento. Em primeiro lugar, creio ser importante que nós façamos uma afirmação abrangente como a do apóstolo João em 1 João 2:6: “Aquele que diz que permanece nele, esse deve também andar assim como ele andou”. Em outras palavras, se nos dizemos cristãos, temos de ser semelhantes a Cristo. Este é o primeiro exemplo do Novo Testamento: temos de ser como o Cristo Encarnado. Alguns de vocês podem ficar horrorizados com essa idéia e rechaçá-la de imediato. “Ora”, me dirão, “não é óbvio que a Encarnação foi um evento absolutamente único, não sendo possível reproduzi-lo de modo algum?” Minha resposta é sim e não. Sim, foi único no sentido de que o Filho de Deus revestiu-se da nossa humanidade em Jesus de Nazaré, uma só vez e para sempre, o que jamais se repetirá. Isso é verdade. Contudo, há outro sentido no qual a Encarnação não foi um evento único: a maravilhosa graça de Deus manifestada na Encarnação de Cristo deve ser imitada por todos nós. Nesse sentido, a Encarnação não foi única, exclusiva, mas universal. Somos todos Monergismo.com – “Ao Senhor pertence a salvação” (Jonas 2:9) www.monergismo.com 3 chamados a seguir o supremo exemplo de humildade que ele nos deu ao descer dos céus para a terra. Por isso Paulo diz em Filipenses 2:5-8: “Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz”. Precisamos ser semelhantes a Cristo em sua Encarnação no que diz respeito à sua admirável humildade, uma humilhação auto-imposta que está por trás da Encarnação. Em segundo lugar, precisamos ser semelhantes a Cristo em sua prontidão em servir. Agora, passemos de sua Encarnação à sua vida de serviço; de seu nascimento à sua vida; do início ao fim. Quero convidá-los a subir comigo ao cenáculo onde Jesus passou sua última noite com os discípulos, conforme vemos no evangelho de João, capítulo 13: “Tirou a vestimenta de cima e, tomando uma toalha, cingiu-se com ela. Depois, deitou água na bacia e passou a lavar os pés aos discípulos e a enxugar-lhos com a toalha com que estava cingido”. Ao terminar, retomou seu lugar e disse-lhes: “Ora, se eu, sendo o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Porque eu vos dei o exemplo” — note-se a palavra — “para que, como eu vos fiz, façais vós também”. Há cristãos que interpretam literalmente esse mandamento de Jesus e fazem a cerimônia do lava-pés em dia de Ceia do Senhor ou na Quinta-feira Santa — e podem até estar certos em fazê-lo. Porém, vejo que a maioria de nós fez apenas uma transposição cultural do mandamento de Jesus: aquilo que Jesus fez, que em sua cultura era função de um escravo, nós reproduzimos em nossa cultura sem levarmos em conta que nada há de humilhante ou degradante em o fazermos uns pelos outros. Em terceiro lugar, temos de ser semelhantes a Cristo em seu amor. Isso me lembra especificamente Efésios 5:2: “Andai em amor, como também Cristo nos amou e se entregou a si mesmo por nós, como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave”. Observe que o texto se divide em duas partes. A primeira fala de andarmos em amor, um mandamento no sentido de que toda a nossa conduta seja caracterizada pelo amor, mas a segunda parte do versículo diz que ele se entregou a si mesmo por nós, descrevendo não uma ação contínua, mas um aoristo, um tempo verbal passado, fazendo uma clara alusão à cruz. Paulo está nos conclamando a sermos semelhantes a Cristo em sua morte, a amarmos com o mesmo amor que, no Calvário, altruistamente se doa. Observe a idéia que aqui se desenvolve: Paulo está nos instando a sermos semelhantes a Cristo na Encarnação, ao Cristo que lava os pés dos irmãos e ao Cristo crucificado. Esses três acontecimentos na vida de Cristo Monergismo.com – “Ao Senhor pertence a salvação” (Jonas 2:9) www.monergismo.com 4 nos mostram claramente o que significa, na prática, sermos conformes à imagem de Cristo. Em quarto lugar, temos de ser semelhantes a Cristo em sua abnegação paciente. No exemplo a seguir, consideraremos não o ensino de Paulo, mas o de Pedro. Cada capítulo da primeira carta de Pedro diz algo sobre sofrermos como Cristo, pois a carta tem como pano de fundo histórico o início da perseguição. Especialmente no capítulo 2 de 1 Pedro, os escravos cristãos são instados a, se castigados injustamente, suportarem e não retribuírem o mal com o mal. E Pedro prossegue dizendo que para isto mesmo fomos chamados, pois Cristo também sofreu, deixando-nos o exemplo — outra vez a mesma palavra — para seguirmos os seus passos. Este chamado para sermos semelhantes a Cristo em meio ao sofrimento injusto pode perfeitamente se tornar cada vez mais significativo à medida que as perseguições se avolumam em muitas culturas do mundo atual. No quinto e último exemplo que quero extrair do Novo Testamento, precisamos ser semelhantes a Cristo em sua missão. Tendo examinado os ensinos de Paulo e de Pedro, veremos agora os ensinos de Jesus registrados por João. Em João 17:18, Jesus, orando, diz: “Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo”, referindo-se a nós. E na Comissão, em João 20:21, Jesus diz: “Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio”. Estas palavras carregam um significado imensamente importante. Não se trata apenas da versão joanina da Grande Comissão; é também uma instrução no sentido de que a missão dos discípulos no mundo deveria ser semelhante à do próprio Cristo. Em que aspecto? Nestes textos, as palavraschave são “envio ao mundo”. Do mesmo modo como Cristo entrou em nosso mundo, nós também devemos entrar no “mundo” das outras pessoas. É como explicou, com muita propriedade, o Arcebispo Michael Ramsey há alguns anos: “Somente à medida que sairmos e nos colocarmos, com compaixão amorosa, do lado de dentro das dúvidas do duvidoso, das indagações do indagador e da solidão do que se perdeu no caminho é que poderemos afirmar e recomendar a fé que professamos”. Quando falamos em “evangelização encarnacional” é exatamente disto que falamos: entrar no mundo do outro. Toda missão genuína é uma missão encarnacional. Temos de ser semelhantes a Cristo em sua missão. Estas são as cinco principais formas de sermos conformes à imagem de Cristo: em sua Encarnação, em seu serviço, em seu amor, em sua abnegação paciente e em sua missão. Quero, de modo bem sucinto, falar de três conseqüências práticas da assemelhação a Cristo. Primeira: A assemelhação a Cristo e o sofrimento. Por si só, o tema do sofrimento é bem complexo, e os cristãos tentam compreendê-lo de variados pontos de vista. Um deles se sobressai: aquele segundo o qual o sofrimento Monergismo.com – “Ao Senhor pertence a salvação” (Jonas 2:9) www.monergismo.com 5 faz parte do processo da transformação que Deus faz em nós para nos assemelharmos a Cristo. Seja qual for a natureza do nosso sofrimento — uma decepção, uma frustração ou qualquer outra tragédia dolorosa —, precisamos tentar enxergá-lo à luz de Romanos 8:28-29. Romanos 8:28 diz que Deus está continuamente operando para o bem do seu povo, e Romanos 8:29 revela que o seu bom propósito é nos tornar semelhantes a Cristo. Segunda: A assemelhação a Cristo e o desafio da evangelização. Provavelmente você já se perguntou: “Por que será que, até onde percebo, em muitas situações os nossos esforços evangelísticos freqüentemente terminam em fracasso?” As razões podem ser várias e não quero ser simplista, mas uma das razões principais é que nós não somos parecidos com o Cristo que anunciamos. John Poulton, que abordou o tema num livreto muito pertinente, intitulado A Today Sort of Evangelism , escreveu: “A pregação mais eficaz provém daqueles que vivem conforme aquilo que dizem. Eles próprios são a mensagem. Os cristãos têm de ser semelhantes àquilo que falam. A comunicação acontece fundamentalmente a partir da pessoa, não de palavras ou idéias. É no mais íntimo das pessoas que a autenticidade se faz entender; o que agora se transmite com eficácia é, basicamente, a autenticidade pessoal”. Isto é assemelhar-se à imagem de Cristo. Permitam-me dar outro exemplo. Havia um professor universitário hindu na Índia que, certa vez, identificando que um de seus alunos era cristão, disse-lhe: “Se vocês, cristãos, vivessem como Jesus Cristo viveu, a Índia estaria aos seus pés amanhã mesmo”. Eu penso que a Índia já estaria aos seus pés hoje mesmo se os cristãos vivessem como Jesus viveu. Oriundo do mundo islâmico, o Reverendo Iskandar Jadeed, árabe e ex-muçulmano, disse: “Se todos os cristãos fossem cristãos — isto é, semelhantes a Cristo —, hoje o islã não existiria mais”. Isto me leva ao terceiro ponto: Assemelhação a Cristo e presença do Espírito Santo em nós. Nesta noite falei muito sobre assemelhação a Cristo, mas será que ela é alcançável? Por nossas próprias forças é evidente que não, mas Deus nos deu seu Santo Espírito para habitar em nós e nos transformar de dentro para fora. William Temple, que foi arcebispo na década de 40, costumava ilustrar este ponto falando sobre Shakespeare: “Não adianta me darem uma peça como Hamlet ou O Rei Lear e me mandarem escrever algo semelhante. Shakespeare era capaz, eu não. Também não adianta me mostrarem uma vida como a de Jesus e me mandarem viver de igual modo. Jesus era capaz, eu não. Porém, se o gênio de Shakespeare pudesse entrar e viver em mim, então eu seria capaz de escrever peças como as dele. E se o Monergismo.com – “Ao Senhor pertence a salvação” (Jonas 2:9) www.monergismo.com 6 Espírito Santo puder entrar e habitar em mim, então eu serei capaz de viver uma vida como a de Jesus”. Para concluir, um breve resumo do que tentamos pensar juntos aqui hoje: O propósito de Deus é nos tornar semelhantes a Cristo. O modo como Deus nos torna conformes à imagem de Cristo é enchendo-nos do seu Espírito. Em outras palavras, a conclusão é de natureza trinitária, pois envolve o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Sermão pregado na Convenção de Keswick em 17 de julho de 2007 Tradução: F. R. Castelo Branco | Outubro 2007 

Parábolas no antigo e novo testamento


O termo grego parabolē (parabolh,) é traduzido com diversos sentidos no contexto do Novo Testamento. Depois dos Evangelhos, somente o escritor aos Hebreus emprega o vocábulo por duas vezes (9.9; 11.19), mas seu uso frequentemente está relacionado aos ensinos de Jesus nos Evangelhos. Em Hebreus 9.9 o vocábulo é traduzido por “alegoria” (ARC), “ilustração” (NVI), “parábola” (TB, ARA) e “símbolos” (BP, TEB, BJ). Em Hebreus 11.19 a ARA traduz o vocábulo por “figuradamente”, seguida pela NVI e ARC; a TEB por “prefiguração”; a BP lê “símbolo” e a TB traz “figura”. Em Mateus 13.18 as versões traduzem literalmente por “parábola”. Em Mateus 21.45 a ARC verte o vocábulo por “palavras” enquanto a TB, ARA, TEB e a NVI mantêm o sentido literal “parábolas”. Os Evangelhos Sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas) usam o termo por quarenta e oito vezes, de acordo com na27 e gnt4:

 parabolai/j  [12]      Mt 3,10,13,34,35; etc.                                                                                       
parabola.j     [4]                   Mt 13.53; 21.45; Mc 4.10,13;

parabolh,   [3]           Mc 4.30; Lc 8.11 [Hb 9.9; 11.19];

parabolh.n    [26]          Mt 13.18,24,31,33,36; 15.15 (etc)

parabolh/j    [3]                   Mt 13.34; Mc 4.34; Lc 8.4.

O vocábulo procede da preposição para (para,), isto é, “ao lado de”, que expressa movimento “próximo a”; e de ballō (ba,llw), que significa “lançar”, “jogar”, “pôr” ou “colocar”. O significado literal, portanto, é “jogar ou lançar ao lado de”, e, por extensão, “comparar”, “figura”, “parábola”. Parábola é a justaposição de “uma coisa ao lado de outra” com a finalidade de comparar e ilustrar uma ou mais verdades.

Todavia, não se deve limitar a parábola às figuras de comparação (metáfora, símile), às figuras de contraste (ironia, eufemismo), e às figuras compostas (alegoria, fábula, enigma)1, mas antes entendê-la como artifício retórico de argumentação análoga, usada como arguto recurso literário, didático e retórico capaz de incluir várias outras figuras. A relação entre as figuras de comparação (o`moio,w) e a parábola (paraba,llw) está explícito em Marcos 4.30. (confira meu livro de hermenêutica).

O próprio J. Jeremias demonstrou a inutilidade de se tentar classificar rigidamente as diferenças entre esses recursos retóricos e estilísticos, uma vez que o māšal inclui “toda sorte de linguagem figurada”.2 Schottroff, no entanto, prefere limitar a parábola ao contexto dos Evangelhos Sinópticos em vez de estudá-la em um sentido mais amplo.Entendo que a preocupação da autora é fugir da limitação a que os escritores ocidentais de tradição aristotélica sempre recaem ao considerar esse recurso dentro do escopo da Retórica, apenas como ilustração para facilitar a compreensão em assuntos de redobrado esforço cognitivo.

Certo é que o emprego sinóptico discorda dessa maneira usual de compreender a parábola. Em Marcos 4.11-13, por exemplo (ver Mt 13.13-17), a parábola é usada com sentido completamente diferente, enigmático. Não é narrada para explicar, mas para ocultar o sentido! Outros textos, como Lucas 4.23, “Médico, cura-te a ti mesmo” (VIatre,( qera,peuson seauto,n), traduzido pela ARC como “provérbio”, como se tratasse de um mero aforismo, é uma parábola, de acordo com a tradição sinóptica (ver 1Sm 10.12; 24.13; Ez 16.44).

Certamente equivale a um aforismo semelhante aqueles que encontramos nos livros de sabedoria do Antigo Testamento, todavia, melhor definido como uma parábola de caráter epigramático sintético e que se presta a uma comparação direta ou metafórica. Percebe-se, portanto, que o ensino parabólico é direto e simples, a fim de que toda audiência possa compreender a insensatez ou a sabedoria demonstrada pelos atores parabólicos. Todavia, a base para a compreensão do recurso parabólico na tradição sinóptica acha-se não somente no Antigo Testamento, mas também nos escritos de Qumran e nos pseudoepígrafos.4

Como afirmou Manson, a pesquisa a respeito da natureza da parábola não deve se restringir “as obras dos retóricos ocidentais”, mas sim, ao “Velho Testamento”5, como faz J. Jeremias ao descrever as parábolas como uma forma de māšal. Nesta categoria, Sellin, Fohrer e Vermes incluem uma variedade de ideias baseadas na comparação: “máxima, provérbio propriamente dito, pronunciamento de sabedoria, similitude e a assim chamada parábola-histórica, seja em prosa ou em poesia”.6 De modo geral, o māšal designa os gêneros literários da doutrina sapiencial do Antigo Testamento empregados de modo elástico e abundante nas escrituras veterotestamentárias. Não se pode negar a correspondência entre as duas tradições, semítica e helênica, entretanto é necessário distinguir entre o modo de falar e a função da parábola na primeira em relação à segunda. Àquela supera esta pela natureza própria da mensagem que transmite.

Lembremos que no Antigo Testamento, a Septuaginta (LXX) traduz o termo hebraico māšal (lv'm') por parabolē (parabolh,); e que o vocábulo semítico é usado com frequência para se referir aos “provérbios” (māšal) dos sábios (1Sm 24.13; Ez 17.2; 18.2; etc.).7 Em sentido lato, tanto o termo hebraico quanto o grego significam “ditos de sabedoria”, ou “comparação com intenção didática”. O significado restrito, por sua vez, quer dizer “comparação”, “correspondência” ou “translação de sentido”, como se emprega geralmente em o Novo Testamento. Mas as correspondências são epidérmicas e fugidias. As parábolas greco-romanas, de acordo com Snodgrass, apresentam significativas diferenças das parábolas de Jesus, embora algumas apresentem o mesmo padrão. Porém, o vocábulo māšal e parabolē como se apresentam nas Escrituras tem um campo semântico superior ao uso comum heleno-latino.8 Segundo Osborne, com exceção da parábola do Bom Samaritano (Lc 10.25-37), as de Jesus são diferentes das mais 325 rabínicas e também das parábolas helênicas.9

Essa estreita relação da parábola nos Sinópticos com o māšal no Antigo Testamento dificulta uma definição abrangente, uma vez que é necessário enfatizar o conceito semítico sem, contudo, ignorar o ocidental. O especialista Snodgrass, após extensa pesquisa, demonstrou a dificuldade de se definir correta e completamente as parábolas pelo caráter multifacetado e amplo desse recurso literário.10 C. H. Dodd também reconheceu a problemática.11  Stein reconhece que é difícil defini-la e prefere enfatizar mais sua classificação juntamente com o gênero māšal; afirma

Em ambos os casos, os termos podem referir-se a um provérbio (1Sm 24.13; Ez 18.2,3; Lc 4.23; 6.39); uma sátira (Sl 44.11; 69.11; Is 14.3,4; Hc 2.4); uma charada (Sl 49.4; 78.2; Pv 1.6); um dito simbólico (Mc 7.14,17; Lc 5.36,38); uma símile extensa ou similitude (Mt 13.33; Mc 4.30,32; Lc 15.8-10); uma parábola histórica (Mt 25.1-13; Lc 14.16,24; 15.11-32; 16.1-8); um exemplo de parábola (Mt 18.23-25; Lc 10.29-37; 12.16-21; 16.19-31); e, até mesmo, uma alegoria (Jz 9.7-20; Ez 16.1-5; 17.2-10; 20.49 – 21.5; Mc 4.3-9,13-20; 12.1-11).12

Apesar do aviso dos especialistas atrevo-me a conceituá-la como: Recurso literário do gênero narrativo e dito fictício que ilustra ou oculta uma verdade moral e religiosa com o propósito de inserir o ouvinte-leitor dentro do enredo para que ele atente para a advertência, o exemplo, a doutrina ou o comportamento que deve ser apreciado ou rejeitado de acordo com o propósito da parábola.

Nesse aspecto é necessário que se entenda a parabolē como recurso importante e necessário aos textos ou ensinos:

a) Admoestativos: isto é, que se propõem por meio de uma analogia   ou comparação advertir de uma falta, aconselhar a uma atitude, ou a exortar (2Sm 12.1-7; Mt 18.23s; Lc 12.16s; 16.1s, etc.);
b) Indicativos: ou seja, que procuram impressionar o leitor-ouvinte a  fim de que sinta admiração, espanto ou repulsa concernente algum ensino de caráter moral ou religioso (Lc 7.40-43; 8.4-18; 16.1-13; etc.);
c) Atitudinais: pois tem por objetivo levar o leitor e ouvinte a se posicionarem a favor ou contra uma ideia, opinião ou verdade em uma controvérsia. O ouvinte-leitor, quando ouve ou lê a comparação é conduzido a decidir-se a favor ou contra aquilo que está evidente na parábola (Mt 20.1-16; 21.28-32, etc.);
d) Aférese: uma vez que o sentido está contido na descrição, mas oculto por supressão da linguagem direta, provocando a suspensão do juízo por parte daqueles que não tem empatia com a mensagem comunicada (Mt 13.13-17; Mc 4.11-13, etc.).
Entre as inúmeras pessoas no Antigo Testamento que usaram este recurso, podemos citar como exemplo, ainda que não exclusivamente:
a) O Profeta Ezequiel: O profeta Ezequiel está entre os inúmeros personagens bíblicos que fizeram uso desse recurso estilístico e didático, a fim de comunicar uma mensagem parenética, nem sempre clara e acessível àqueles que estivessem à margem dos contextos político e religioso de seu tempo (cf. Ez 17.3-10; 19.2-9,10-14; 21.1-5; 24.3-5; cf. Is 5.1-7).

b) Os Sábios de Israel: As parábolas também eram usadas pelo povo, sábios e profetas de Israel em forma de provérbios parabólicos (cf. Ez 18.1-3; Sl 78.2; ver 2Sm 12.1-14; 14.1-11; 1Rs 20.35-40).13 O propósito da parábola facilmente é visto quando observamos o uso da figura nas mensagens e ensinos dos sábios e profetas. Uma verdade ficava mais clara e inteligível ao povo quando era  acompanhada de uma narrativa que colocava a realidade a ser percebida com a história a ser contada.

De modo semelhante, com o emprego do método parabólico para descrever o ensino e a mensagem do Reino de Deus, Jesus pretendia tornar a realidade e verdades do Reino de Deus compreensível ao homem de seu tempo, desde que esse respondesse positivamente ao seu ensino. Esta é a principal razão pela qual repetidamente a parábola se inicia com o adjetivo e derivados de homois (o[moij; Mt 13.24; 31, 44, 45, 47), traduzido por “semelhante”, mas que também significa “da mesma natureza”, “igual” ou “similar”. A similitude está na relação entre a narrativa e a coisa exemplificada. Contudo, a eficiência da parábola, como atesta Manson, não depende de sua “possível virtude ilustrativa”, mas da “reação” daqueles a quem a parábola é dirigida.14


Esdras Costa Bentho é pedagogo, Coordenador de Teologia na FAECAD, teólogo, Mestre em teologia pela PUC - RJ, concluindo o doutoramento na mesma instituição, PUC RJ.

Nao somos Deus!


Um dos erros que cometi no meu início na Teologia Reformada foi associar Calvinismo e racionalismo. E muitos calvinistas* parecem crer que reformado é igual a racionalista. Infelizmente, 10/13 anos atrás eu não tinha maturidade teológica e nem filosófica para perceber a armadilha.

Para essa ala do Calvinismo*, tudo na fé cristã precisa ser bem explicadinho, no pior estilo 1+1=2. É o endeusamento da "razão". Não há lugar para o Mistério da Fé. Tudo é racionalizado. Se você ler, por exemplo, um Vicente Cheung da vida, será bombardeado com a ideia de que o Mistério seria, na verdade, covardia intelectual e uma forma elegante de justificar o erro. Cheung não se importa de blasfemar contra Deus, nem de sacrificar a linguagem bíblica no altar do racionalismo. Ele crê na Razão, não no Evangelho. Outro sintoma da mesma coisa é odiarem a ideia de paradoxo.

Acontece que o Paradoxo, e o Mistério da Fé, é parte essencial da Revelação e da própria Dogmatica cristã. Tentar eliminá-los da teologia e da espiritualidade equivale, penso, a criar uma nova religião. Tudo isso me parece estar muito longe do Cristianismo.

Quando leio as Escrituras encontro conceitos bem paradoxais. Pode parecer assustador, mas a Bíblia não é um compêndio de Teologia Sistemática. Ela não é calvinista, arminiana, pentecostal, luterana. Ela é, na verdade, o testemunho das experiências de fé do Povo de Deus. E a experiencia da fé é paradoxal. Como já escrevi algumas vezes, o agir de Deus na História é encarnacional. E a Encanacão é Mistério de Fé. E paradoxal. Não tem como fugir disso nas realidades da vida cristã. Somos Santos, mas pecadores - terrivelmente pecadores. Cristo não tarda, não demora cumprir Sua Promessa, mas nossa Escatologia é há muito um angustiante "ainda não" - "Já, mas ainda não".

A mesma Bíblia que diz "já passou da Morte para a vida" e "nenhuma condenação há", é a mesma que diz "você também pode ser cortado", "guarde o que tens para que não roubem a tua coroa". Há outros exemplos. Somos salvos pela fé, sem Obras. Mas a fé, sem Obras, é morta. Na Cruz tudo foi consumado, mas somos batizados "para remissão dos PECADOS". Como explicar isso? Bom, ao inves de escrever duas mil páginas para tentar explicar** esses paradoxos, pq simplesmente não aceitar a autoridade das Escrituras sobre TODAS suas afirmacões teológicas, mesmo as que causam desconforto ao nosso "sistema"? Ah! Mas tem de ser tudo bem explicadinho! Precisa ser igual tabuada e regrinha de três!

Quem disse?

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*Outras correntes correm o mesmo risco e tendem a cair no racionalismo também. Vejam como, por exemplo, os ARMINIANOS, boa parte deles pelo menos, explicam a predestinação tão bem "explicadinha" que a conclusáo é, ao fim e ao cabo, quase o mesmo que nao ter predestinação, nem eleição. Ou como os "memorialistas" esvaziam tanto os Sacramentos que a razão para Batizarem e Ceiarem se resume quase a um "a gente faz por que é mandamento, mas eles nao são realmente necessários". E por aí vai.

** Não critico com isso as explicacões, nem a Teologia Sistemática. Quero apenas enfatizar que nossas teologias são esforços humanos para entender o Mistério, não substitutos para ele.

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A imagem de Deus



Introdução: Este talvez seja um dos capítulos mais importantes que estudaremos. Tentaremos responder perguntas como: Em que consiste a imagem de Deus no homem? Que efeito teve a queda do homem sobre a imagem de Deus? O que queremos dizer quando afirmamos que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus?

O conceito de imagem de Deus é o coração da antropologia cristã. Precisamos entender bem este conceito.

O homem distingue-se das demais criaturas de Deus, porque foi criado de uma maneira singular. Apenas do homem é dito que ele foi criado à imagem de Deus. Esta expressão descreve o homem na totalidade de sua existência, ele é um ser que reflete e espelha Deus. (Gn 1:26-28).

Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela terra.

Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou.

E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra. (Gn 1:26-28).

A imagem de Deus no homem não é algo acidental, mas é algo essencial à natureza humana. O homem não pode ser homem sem a imagem de Deus. O homem é a imagem de Deus, não simplesmente a possui, como se fosse algo que lhe foi acrescentado.


“Imagem” e “Semelhança”?

Qual o significado destas palavras?

Aqui eu quero ver com os irmãos, os 4 estágios da imagem de Deus no homem. A imagem original, a imagem desfigurada, A imagem original, a Imagem desfigurada, A imagem restaurada e a Imagem aperfeiçoada.

1 - A imagem de Deus no homem originalmente

No Velho Testamento encontramos apenas três passagens que tratam de forma específica a questão da imagem de Deus. (Gen. 1:26-28; 5:1-3; 9:6).

“Façamos o homem à nossa imagem e semelhança” . Sobre o significado das palavras "Imagem e Semelhança" entendemos que elas não se referem a coisas diferentes, embora alguns defensores da fé do passado tivessem crido diferente (1).

Veja as razões porque entendemos que estes dois termos querem significar a mesma coisa:

Em Gen. 1:26, aparecem as duas palavras "imagem e semelhança"; em 1:27 o autor usou apenas o termo "imagem"; em 5:1 ele resolve substituir o termo por outro - "semelhança", e, em 5:3, o autor novamente volta a usar as duas palavras , contudo em ordem diferente daquela usada em 1:26 - "semelhança e imagem" e em 9:6 ele volta a usar apenas um dos termos, optando agora pelo termo "imagem". Isto, deixa suficientemente claro para nós que "imagem e semelhança" são termos sinônimos, e que querem dizer a mesma coisa. Caso não fosse assim, o autor não faria estas mudanças alternando os termos.


O Que Significa ser Criado á Imagem e Semelhança?

Mas o que entendemos por Imagem e Semelhança? Por estes dois termos queremos dizer que o homem foi criado para refletir, espelhar e representar Deus. Nossos primeiros pais foram criados para refletir as qualidades que haviam em Deus, e isto em perfeita obediência, sem pecado. Agostinho diz que o homem foi criado "capaz de não pecar" (2). O homem podia agir perfeitamente e obedientemente na adoração , no serviço a Deus, no domínio e cuidado da criação e no amor e companheirismo uns com os outros.

Berkhof diz que na concepção reformada, a Imagem de Deus consiste na integridade original da natureza do homem, integridade esta expressa:

a. No Conhecimento Verdadeiro - Cl 3:10
E vos revestistes do novo homem, que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou”.

b. 
Na Justiça - Ef. 4:24
E vos revestais do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade”.

c.
 Na Santidade - Ef 4:24
E vos revestiais do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade” (3).

Van Groningen assevera que:

Ao criar a humanidade á sua própria imagem, Deus estabeleceu uma relação na qual a humanidade poderia refletir, de modo finito, certos aspectos do infinito Rei-Criador. A humanidade deveria refletir as qualidades éticas de Deus, tais como "retidão e verdadeira santidade"... e seu "conhecimento" (Cl 3:10). A humanidade deveria dar expressão ás funções divinas em ralação ao cosmos e atividades tais como encher a terra, cultivá-la e governar sobre o mundo criado. A humanidade em uma forma física, também refletiria as próprias capacidades do Criador: apreender, conhecer, exercer amor, produzir, controlar e interagir (4).

Percebemos nas palavras do Dr. Van Groningen que ele apresenta a imagem de Deus como tendo uma tríplice relação:

A. Relação com Deus,
B. Relação com o próximo
C. Relação com a criação.

Iremos verificar em nosso estudo que em seu estado glorificado, os santos refletirão esta imagem e semelhança restaurando no estado final, esta tríplice relação em sua perfeição.

Antes do homem cair em pecado, ele refletia perfeitamente a imagem de Deus. Tudo estava em perfeita harmonia. Mas em que consistia este refletir a imagem de Deus?(5)

1 - O homem reflete a imagem de Deus como um ser que é relacional. Ele não é um ser que vive isolado, assim como Deus não vive só. Deus é Tripessoal, e se relaciona entre as pessoas da Trindade (Gn 1:26 - "Façamos o homem ... ")

O homem é uma pessoa, e como tal ele se relaciona. Foi por isto que Deus lhe fez uma companheira.

2 - O homem reflete a imagem de Deus pela sua capacidade de dominar sobre as outras coisas criadas.

O homem foi colocado como "senhor" da terra, para governá-la e cuidar dela. (Gn 1:26-28). O domínio do homem sobre as coisas criadas é parte essencial de sua natureza. Nesse sentido, o homem imita o Seu Criador, pois Deus é o Senhor soberano e absoluto exercendo domínio sobre toda a terra.

A Deus pertence o domínio e o poder; ele faz reinar a paz nas alturas celestes. Jó 25:2

O teu reino é o de todos os séculos, e o teu domínio subsiste por todas as gerações. O SENHOR é fiel em todas as suas palavras e santo em todas as suas obras. Sl 145:13

Dn. 4:3,25,34

Quão grandes são os seus sinais, e quão poderosas, as suas maravilhas! O seu reino é reino sempiterno, e o seu domínio, de geração em geração. V. 3

Serás expulso de entre os homens, e a tua morada será com os animais do campo, e dar-te-ão a comer ervas como aos bois, e serás molhado do orvalho do céu; e passar-se-ão sete tempos por cima de ti, até que conheças que o Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens e o dá a quem quer. v. 25

Mas ao fim daqueles dias, eu, Nabucodonosor, levantei os olhos ao céu, tornou-me a vir o entendimento, e eu bendisse o Altíssimo, e louvei, e glorifiquei ao que vive para sempre, cujo domínio é sempiterno, e cujo reino é de geração em geração. v. 34

Se alguém fala, fale de acordo com os oráculos de Deus; se alguém serve, faça-o na força que Deus supre, para que, em todas as coisas, seja Deus glorificado, por meio de Jesus Cristo, a quem pertence a glória e o domínio pelos séculos dos séculos. Amém! I Pe 4:11

Domine ele de mar a mar e desde o rio até aos confins da terra. Sl 72:8

3 - O homem reflete a imagem de Deus por Ter atributo que chamamos "essenciais" nele; sem os quais ele não poderia continuar sendo o que é:

a) Poder intelectual: É a faculdade de raciocinar, inteligência e outras capacidades intelectivas em geral, que refletem aquilo que Deus tem.

b) Afeições naturais: É a capacidade que o homem tem de ligar-se emocionalmente e afetivamente a outros seres e coisas. Deus tem esta capacidade.

c) Liberdade moral: Capacidade que o homem tem de fazer as coisas obedecendo a princípios morais.

d) Espiritualidade: A Escritura diz que o homem foi criado "alma vivente" (Gn 2:7). É a natureza imaterial do homem. Deus é espírito, e num certo sentido, o homem tem traços desta espiritualidade.

e) Imortalidade: Depois de criado, o homem não deixa mais de existir. A morte não é para o corpo, mas para o homem. Morte é separação e não cessação de existência. A imortalidade é essencial para Deus (I Tm 6:16). O homem, num caráter secundário derivado, passa a Ter a imortalidade.

 

2 - A queda e a Imagem Desfigurada

Como sabemos, este estado de integridade (“posso não pecar”) não foi mantido até o fim pelos nossos primeiros pais. Veio a desobediência e consequentemente a queda. Nossos primeiros pais, criados para refletir e representar Deus não passaram no teste. Provados, caíram e deformaram a imagem de Deus neles.

Podemos fazer a seguinte pergunta: Quando o homem caiu, perdeu ele totalmente a Imago Dei?

Respondemos que em seu aspecto estrutural ou ontológico (aquilo que o homem é), não foi eliminado com a queda, o homem continuou homem, mas após a queda, o aspecto funcional (aquilo que o homem faz) da imago Dei, seus dons, talentos e habilidades passaram a ser usados para afrontar a Deus.

Para Calvino, a imagem de Deus não foi totalmente aniquilada com a Queda, mas foi terrivelmente deformada Ele descreveu esta imagem depois da queda como “uma imagem deformada, doentia e desfigurada” (6).

O homem antes criado para refletir Deus, agora após a queda, precisa ter esta condição restaurada. Restauração esta que se estenderá por todo o processo da redenção. Esta renovação da imagem original de Deus no homem significa que o homem é capacitado a voltar-se para Deus, a voltar-se para o próximo e também voltar-se para a criação para governá-la.

3 - Cristo e a Imagem Renovada

Num sentido, como já dissemos, o homem ainda é portador da imagem de Deus, mas também num sentido, ele precisa ser renovado nesta imagem.

Esta restauração da imagem só é possível através de Cristo, porque Cristo é a imagem perfeita de Deus, e o pecador precisa agora tornar-se mais semelhante a Cristo. Lemos em Cl. 1:15 "Ele é a imagem do Deus invisível" e em Romanos 8:29 que Deus nos predestinou para sermos "Conforme a imagem de Seu Filho ..." (I Jo 3:2; II Co 3:18)


4 - A Imagem Aperfeiçoada

A completação da perfeição dos cristãos será a participação da final glorificação de Cristo Jesus. Não somos apenas herdeiros de Deus, mas também co-herdeiros com Cristo, “Se com ele sofremos, para que também com ele sejamos glorificados” (Rm 8:17). Não podemos pensar em Cristo separado de seu povo, nem de seu povo separado dele. Assim será na vida futura: a glorificação dos cristãos ocorrerá junto com a glorificação do Senhor Jesus . É exatamente isto que Paulo nos ensina em Cl 3:4:

“Quando Cristo que é a nossa vida, se manifestar, então vós também sereis manifestados com ele, em glória”.

A glorificação é voltar à perfeição com a qual fomos criados por Deus, é voltar a imagem de Deus. Este é o propósito último de nossa redenção. Esta perfeição da imagem será o auge, a consumação do plano redentivo de Deus para o seu povo. E isto só é possível em Cristo.

Em Cristo, o eleito não apenas volta ao que era Adão antes de pecar, mas vai um pouco mais à frente:

Note as palavras de Anthony Hoekema:

Devemos ver o homem à luz de seu destino final (...) Adão ainda podia perder a impecabilidade e bem aventurança, mas aos santos glorificados isso não poderá mais ocorrer. Adão era "Capaz de não pecar e morrer"(posse non peccare et mori), os santos na glória, porém "não serão capazes de pecar e morrer" (non posse peccare et mori). Esta perfeição, que não se poderá perder, é aquilo para o qual o homem foi destinado e nada menos do que isto (7)

Sabemos que os santos glorificados, em seu estado final não vão pecar nem morrer. Várias passagens das Escrituras nos garantem isto. (Is. 25:8 I Cor. 15:42,54; Ef. 5:27; Ap. 21:4)

Paulo em sua carta aos Efésios nos ensina que o propósito de Deus para sua igreja, é apresentá-la “a si mesmo Igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito” (cf. Ef. 5:27)

Nesta dispensação, até a Segunda Vinda de Cristo, carregamos conosco, conforme lemos em I Cor. 15:49, a “imagem do que é terreno”, mas na glorificação, teremos plena e perfeitamente a “imagem do celestial”, ou seja, a imagem de Cristo. No porvir, nossa vida será gloriosa, porque teremos a imagem de Cristo, seremos como Ele é, e Cristo sendo a imagem de Deus, teremos a imagem de Deus de volta em nós de forma completa e perfeita.

Calvino comentando este texto de I Cor. 15:49 diz:

Pois agora começamos a exibir a imagem de Cristo, e somos transformados nela diária e paulatinamente; porém esta imagem depende da regeneração espiritual. Mas depois seremos restaurados à plenitude, que em nosso corpo, quer em nossa alma, o que agora teve início será levado à completação, e alcançaremos, em realidade, o que agora esperamos(8)

Note ainda as palavras de João: “Amados, agora somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que havemos de ser. Sabemos que quando Ele se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque havemos de vê-lo como ele é” (I Jo. 3:2).

O que João nos diz, é que, na ocasião da Segunda Vinda de Cristo, seremos assemelhados a Ele, perfeita e completamente. E como Cristo é a imagem de Deus invisível, os santos glorificados terão a imagem de Cristo. Isto significa dizer que a nossa imagem na glorificação, será restaurada à imagem de Deus. Esta semelhança a Deus e a Cristo é o propósito final da nossa redenção, ou seja, a glorificação.

Por enquanto, a imagem de Cristo em nós está em processo contínuo conforme nos diz Paulo em II Cor. 3:18 que estamos “sendo transformados de glória em glória” , mas após a nossa ressurreição, poderemos refletir a perfeição desta imagem, que Deus começou em nós, e assim, só então, poderemos ser tudo aquilo para o qual fomos destinados pelo Pai.

Neste processo de restauração da imagem de Deus em nós, através de Cristo, chamamos de santificação que é a “conformidade progressiva à imagem de Cristo aqui e agora (...); a glória é a conformidade perfeita a imagem de Cristo lá e então, Santificação é a glória começada; glória é a santificação completada” (9)

Gerrit C. Berkouwer, teólogo holandês, nos mostra que a verdadeira imagem de Deus se pode conseguir apenas em Jesus Cristo que é a imagem perfeita de Deus. Ser renovado á imagem de Deus é tornar-se parecido com Jesus (10).

Todo o povo de Deus, de todas as nações, tribos, línguas, estará então com Deus por toda a eternidade, glorificando a Deus pela adoração, serviço e louvor. Todos nossos atos serão enfim feitos sem pecado com perfeição e aí o propósito que Deus estabeleceu para seus remidos terá sido alcançado.


A Imagem de Deus para João Calvino (1509 - 1564) -

Veja como Calvino responde ás seguintes questões sobre a Imagem de Deus:

1 - Onde situa-se a imagem de Deus no homem?

R: Segundo Calvino, ela é encontrada fundamentalmente na alma do homem.

2 - Em que constitui originalmente a imagem de Deus?

R: Com base em Cl 3:10 e Ef 4:24, Calvino conclui que a imagem de Deus no homem incluía originalmente o verdadeiro conhecimento, justiça e santidade.

3 - Existe algum aspecto sob o qual o homem decaído ainda é a imagem de Deus?

R: Antes da queda, de acordo com Calvino, o homem possuía a imagem de Deus em sua perfeição. A queda, contudo, teve um efeito devastador sobre esta imagem. A imagem de Deus não é totalmente aniquilada pela queda, mas é terrivelmente afetada, deformada.

4 - O que a queda fez à imagem de Deus?

R: O que aconteceu foi que quaisquer dons ou habilidades que o homem reteve, tais como razão e a vontade foram pervertidos e deturpados pela queda. Todas as suas faculdades estão viciadas e corrompidas.

5 - Como a imagem de Deus é renovada no homem?

R: Para Calvino, esta imagem é restaurada pela fé e começa na conversão. É a nossa conformação com a pessoa de Cristo. Isto é uma obra da graça de Deus que se inicia na regeneração e progressivamente termina na glorificação dos santos.

6 - Quando será completada a renovação da imagem de Deus?

R: Calvino responde: Na vida por vir. Seu explendor pleno será alcançado apenas no céu.


NOTAS

(1) Tertuliano (160-225); Orígenes e Clemente de Alexandria (Ver Hoekema: Criados á Imagem de Deus (São Paulo, Ed. Cultura Cristã, 1999), 46-8.

(2) Santo Agostinho, citado por Hoekema, op cit, p. 98.

(3) L. Berkhof, Teologia Sistemática (São Paulo: Luz para o Caminho, 1990), 206.

(4) Gerard Van Groningen, Revelação Messiânica no Velho testamento (Luz para o caminho: Campinas) 1995.

(5) Extraído adaptado de Apostila do Dr. Héber C. de Campos.

(6) As Institutas, I, XV, 3.

(7) Anthony Hoekema - Criados Á Imagem de Deus (São Paulo, Ed. Cultura Cristã , 1999), 108.

(8) João Calvino, Comentário de I Coríntios , (Edições Paracletos, São Paulo, 1996), 488.

(9) F. F. Bruce, citado por Geoffrey B. Wilson, Romanos - Um Resumo de Pensamento Reformado, (SP - PES) 130.

(10) G.C.Berkouwer, Man, The image of God, p. 107.


EXERCÍCIOS PARA FIXAÇÃO DA MATÉRIA

1) O que significa dizer que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus?

2) “Imagem” e “Semelhança” são termos que querem dizer a mesma coisa ou coisas diferentes?

3) Segundo Berkhof, em que consiste a integridade original da natureza do homem?

4) Como o homem reflete a Imagem de Deus?

5) Com a queda, o homem perdeu a imagem de Deus? Justifique:

6) Como a imagem de Deus é renovada no homem?



Rev. Gildásio Reis, Pastor da Igreja Presbiteriana de Osasco, Psicanalista Clínico, Mestre em Teologia pelo centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper (Educação Cristã) e Professor de Teologia Pastoral no Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição.

Há quanto tempo você está sem comer?


.

Dependendo da hora, você pode estar comendo enquanto lê essa publicação. Qual o máximo de dias que você aguentou sem comer? Tem gente que não aguenta nem 12 horas. Qual foi a última coisa que você comeu? Talvez um bom arroz com feijão e bife, ou uma macarronada, ou um cafezinho com pão.
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Em tudo isso damos valor, mas as perguntas ganham ares de constrangimento se forem feitas assim: Há quanto tempo você está sem ler a Bíblia? Qual o máximo de dias que você ficou sem ler a Bíblia? Qual foi o último devocional que você fez? É incrível como muitos ficariam calados se essas perguntas fossem feitas pessoalmente, ou dariam justificativas de todo tipo que, no fundo, sabem que não respondem à questão e que somente são condenação para si mesmos.
.
Jesus passou 40 dias no deserto, mas nenhum dia sequer sem meditar na Palavra de Deus. O próprio Jesus fez isso. Não temos muito o que argumentar. Quanto mais justificativas damos por não lermos a Bíblia diariamente, mais nos assemelhamos a crianças que dão justificativas para não comer o almoço e já querer um chocolate.
Não se engane. A maturidade espiritual é um processo. Não existem classes de crentes, mas existem graus de maturidade espiritual. Pessoas que não se alimentam direito não deixam de serem humanas, por terem uma alimentação ruim, mas certamente viverão doentes ou sob o risco de serem derrubadas por qualquer resfriado. Você já entendeu a analogia.
.
Paulo nos adverte a desenvolver a salvação com temor e com tremor, porque é Deus quem opera o querer e o efetuar (Fp 2:12-13). Soberania de Deus e responsabilidade humana caminham lado a lado no processo de maturidade espiritual. Saber que Deus é quem opera a vontade e o desempenho da salvação em nós, deveria atiçar a responsabilidade e amor por buscá-las nas Escrituras diariamente, e não nos deixar letárgicos, pensando que de repente iremos ler a Bíblia toda em 40 dias, quando não a lemos nem em todos os anos de convertidos.
.
Sua maturidade espiritual de buscar a Palavra de Deus está diretamente ligada a quanto você reconhece o poder e graça de Deus na obra de salvação na sua vida.


Pr. Yago Martins.

TULIP- Pontos da doutrina da graca!

Rev. André do Carmo Silvério


É muito comum se ouvir falar sobre “Os Cinco Pontos do Calvinismo”. Eu mesmo, quando me tornei aluno da classe de catecúmenos, com a finalidade de ser membro da Igreja Presbiteriana do Brasil, lembro-me de ouvir por várias vezes falar sobre esse assunto. Contudo, meu raciocínio não era outro, senão, o de achar que o autor destes pontos era de fato o próprio reformador do século XVI: João Calvino. Mas somente no Seminário pude ter um contato mais próximo com obras literárias que falavam sobre o assunto, e, desta forma, creio ter sido esclarecido sobre o que realmente vem a ser “Os Cinco Pontos do Calvinismo”.

Portanto, o objetivo deste pequeno artigo é esclarecer de forma simples quem de fato escreveu os chamados “Cinco Pontos do Calvinismo”, por qual razão e porque eles são “cinco pontos” ao invés de sete ou dez. Além disso, procuraremos destacar a sua relevância para a nossa teologia.


1. Autoria

Ao contrário do que muitos pensam, não foi João Calvino quem escreveu “Os Cinco Pontos do Calvinismo”. Talvez algumas pessoas ficarão impressionadas com esta afirmação. No entanto, a magna pergunta que se faz é: Se não foi Calvino, quem foi então? “Estes cinco pontos foram formulados pelo Sínodo de Dort, Sínodo este convocado pelos estados Gerais (da Holanda) e composto por um grupo de 84 Teólogos e 18 representantes seculares, entre esses estavam 27 delegados da Alemanha, Suíça, Inglaterra e outros países da Europa reunidos em 154 Sessões, desde 13 de novembro de 16 18 até maio de 1619” . [1] Portanto, peca por ignorância quem afirma ser João Calvino o autor destes cinco pontos, porque na verdade, a afirmação correta é que estes “pontos” foram fundamentados tão somente nas doutrinas ensinadas por ele. Aliás, este sistema doutrinário, se assim podemos chamá-lo, foi elaborado somente 54 anos após a morte do grande reformador (1509-1564).

 

2. Razão de sua Escrita

Os Cinco Pontos do Calvinismo foram formulados em resposta a um “documento que ficou conhecido na história como ‘Remonstrance' ou o mesmo que ‘Protesto'”, [2]apresentado ao Estado da Holanda pelos “discípulos do professor de um seminário holandês chamado Jacob Hermann, cujo sobrenome latino era Arminius (1560-1600). Mesmo estando inserido na tradição reformada, Arminius tinha sérias dúvidas quanto à graça soberana de Deus, visto que era simpático aos ensinos de Pelágio e Erasmo, no que se refere à livre vontade do homem”. [3] Este documento formulado pelos discípulos de Arminius tinha como objetivo mudar os símbolos oficiais de doutrinas das Igrejas da Holanda (Confissão Belga e Catecismo de Heidelberg ), substituindo pelos ensinos do seu mestre. Desta forma, a única razão pela qual Os Cinco Pontos do Calvinismo foram elaborados era a de responder ao documento apresentado pelos discípulos de Arminius.


3. Porque Cinco Pontos?

Este documento formulado pelos alunos de Jacob Arminius tinha como teor cinco principais pontos, conhecidos como “Os Cinco Pontos do ArminianismoE como já dissemos logo acima, em resposta a este Cinco Pontos do Arminianismo, o Sínodo de Dort elaborou também o que conhecemos como “Os Cinco Pontos do Calvinismo” ao invés de sete ou dezEstes pontos do calvinismo são conhecidos mundialmente pela palavra TULIP, um acróstico popular que na língua inglesa significa:

otal DepravityTotal Depravação
nconditional ElectionEleição Incondicional
imited AtonementExpiação Limitada
rresistible GraceGraça Irresistível
erseverance of SaintsPerseverança dos Santos

 

4. Os Cinco Pontos do Arminianismo Versus Os Cinco Pontos do Calvinismo [4]

 

Arminianismo

Calvinismo

 

1. Vontade Livre – O arminianismo diz que a vontade do homem é “livre” para escolher, ou a Palavra de Deus, ou a palavra de Satanás. A salvação, portanto, depende da obra de sua fé.

 

1. Depravação Total – O calvinismo diz que o homem não regenerado é absolutamente escravo de Satanás, e, por isso, é totalmente incapaz de exercer sua própria vontade livremente (para salvar-se), dependendo, portanto, da obra de Deus, que deve vivificar o homem, antes que este possa crer em Cristo.

 

 

2. Eleição Condicional – O arminianismo diz que a “eleição é condicional, ou seja, acredita-se que Deus elegeu àqueles a quem “pré-conheceu”, sabendo que aceitariam a salvação, de modo que o pré-conhecimento [de Deus] estava baseado na condição estabelecida pelo homem.

 

2. Eleição Incondicional – O calvinismo sustenta que o pré-conhecimento de Deus está baseado no propósito ou no plano de Deus, de modo que a eleição não está baseada em alguma condição imaginária inventada pelo homem, mas resulta da livre vontade do Criador à parte de qualquer obra de fé do homem espiritualmente morto.

 

 

 

3. Expiação Universal – O arminianismo diz que Cristo morreu para salvar não um em particular, porém somente àqueles que exercem sua vontade livre e aceitam o oferecimento de vida eterna. Daí, a morte de Cristo foi um fracasso parcial, uma vez que os que têm volição negativa, isto é, os que não querem aceitar, irão para o inferno.

 

 

3. Expiação Limitada – O calvinismo diz que Cristo morreu para salvar pessoas determinadas, que lhe foram dadas pelo Pai desde toda a eternidade. Sua morte, portanto, foi cem por cento bem sucedida, porque todos aqueles pelos quais ele não morreu receberão a “justiça” de Deus, quando forem lançados no inferno.

 

4. A Graça pode ser Impedida – O arminianismo afirma que, ainda que o Espírito Santo procure levar todos os homens a Cristo (uma vez que Deus ama a toda a humanidade e deseja salvar a todos os homens), ainda assim, como a vontade de Deus está amarrada à vontade do homem, o Espírito [de Deus] pode ser resistido pelo homem, se o homem assim o quiser. Desde que só o homem pode determinar se quer ou não ser salvo, é evidente que Deus, pelo menos, “permite” ao homem obstruir sua santa vontade. Assim, Deus se mostra impotente em face da vontade do homem, de modo que a criatura pode ser como Deus, exatamente como Satanás prometeu a Eva, no jardim [do Éden].

 

4. Graça Irresistível – O calvinismo entende que a graça de Deus não pode ser obstruída, visto que sua graça é irresistível. Os calvinistas não querem significar com isso que Deus esmaga a vontade obstinada do homem como um gigantesco rolo compressor! A graça irresistível não está baseada na onipotência de Deus, ainda que poderia ser assim, se Deus o quisesse, mas está baseada mais no dom da vida, conhecido como regeneração. Desde que todos os espíritos mortos (= alienados de Deus) são levados a Satanás, o deus dos mortos, e todos os espíritos vivos (= regenerados) são guiados irresistivelmente para Deus (o Deus dos vivos), nosso Senhor, simplesmente, dá a seus escolhidos o Espírito de Vida. No momento que Deus age nos eleitos, a polaridade espiritual deles é mudada: Antes estavam mortos em delitos e pecados, e orientados para Satanás; agora são vivificados em Cristo, e orientados para Deus.

 

 

5. O Homem pode Cair da Graça – O arminianismo conclui, muito logicamente, que o homem, sendo salvo por um ato de sua própria vontade livremente exercida, aceitando a Cristo por sua própria decisão, pode também perder-se depois de ter sido salvo, se resolver mudar de atitude para com Cristo, rejeitando-o! (Alguns arminianos acrescentariam que o homem pode perder, subseqüentemente, sua salvação, cometendo algum pecado, uma vez que a teologia arminiana é uma “teologia de obras” – pelo menos no sentido e na extensão em que o homem precisa exercer sua própria vontade para ser salvo). Esta possibilidade de perder-se, depois de ter sido salvo, é chamada de “queda (ou perda) da graça”, pelos seguidores de Arminius. Ainda, se depois de ter sido salva, a pessoa pode perder-se, ela pode tornar-se livremente a Cristo outra vez e, arrependendo-se de seus pecados, “pode ser salva de novo”. Tudo depende de sua continua volição positiva até à morte!

 

 

5. Perseverança dos Santos – O calvinismo sustenta muito simplesmente que a salvação, desde que é obra realizada inteiramente pelo Senhor – e que o homem nada tem a fazer antes, absolutamente, “para ser salvo” -, é óbvio que o “permanecer salvo” é, também, obra de Deus, à parte de qualquer bem ou mal que o eleito possa praticar. Os eleitos ‘perseverarão' pela simples razão de que Deus prometeu completar, em nós, a obra que ele começou. Por isso, os cinco pontos de TULIP incluem a Perseverança dos Santos .

 

5. Considerações Finais

Para inteirar o leitor do todo da história, Spencer nos diz que após o Sínodo de Dort se reunir em 154 Sessões num “completo exame das doutrinas de Arminius e comparar cuidadosamente seus ensinos com os ensinos das Escrituras Sagradas, chegaram à conclusão que os ensinos de Arminius eram heréticos”. [5] “E não somente isto, mas o Concílio impôs censura eclesiástica aos ‘remonstrantes' depondo-os dos seus cargos, e a autoridade civil (governo) os baniu do país por cerca de seis anos”. [6]

Diante disso, creio que a diferença crucial entre o Arminianismo e o Calvinismo se resume na palavra Soberania. Enquanto os calvinistas entendem que Deus opera a salvação na vida do ser-humano conforme a sua livre e soberana vontade, os arminianos salientam que o homem é capaz de por si só querer ou não ser salvo. Se partirmos da premissa que o homem está completamente morto diante de Deus como nos ensina Efésios 2:1, entenderemos porque a salvação depende tão somente da graça e da misericórdia do SENHOR, pois “não depende de quem quer ou quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia” (Rm 9:16). Portanto, creio que os objetivos deste artigo foram de fato alcançados, demonstrando assim a verdadeira história dos “Cinco Pontos do Calvinismo”. Que assim, queira o Senhor nosso Deus nos abençoar e nos dar sempre a graça de sermos verdadeiros propagadores da história reformada.


NOTAS:

[1] - Tradução livre e adaptada do livro The Five Points of Calvinism, www.unifil.br/teologia/arquivos/ cincopontoscalvinoesboco.pdf

[2] - The Five Points of Calvinism, p. 1, ob.cit.

[3] - Duane E. Spencer, TULIP, Os Cinco Pontos do Calvinismo à Luz das Escrit uras, p. 111-112, Parakletos, 2ª Edição – São Paulo – 2000.

[4] - Esta síntese foi retirada do livro TULIP , p. 15-19.

[5] - TULIP , p. 112.

[6] - The Five Points of Calvinism, p. 6.

 

Rev. André do Carmo Silvério

Pastor da Igreja Presbiteriana do Jardim Girassol – Guarulhos,
Professor de Teologia Sistemática no Instituto Bíblico Presbiteriano Rev. Boanerges Ribeiro e Secretário de Mocidade da Confederação Norte Paulistano

 

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